Por Marcelo Deldebbio
Sempre
que falamos de “Sacrifício de Animais”, nos vem à cabeça a imagem de satanistas
malignos torturando e matando gatos ou então macumbeiros bebendo cachaça e
fumando charutos, torturando e matando bodes e galinhas à torto e à direito sem
critério nenhum… pastores evangélicos e a mídia católica usam e abusam de
mentiras e estereótipos para jogar a opinião pública contra as religiões afros,
tentando ligar rituais de magia negra a seus cultos. No caso de animaizinhos, é
pior ainda, porque usa da boa fé das pessoas que se comovem com o “sofrimento
animal” para usá-las como massa de manobra religiosa.
A questão é muito ampla e seria bom separar todas as variáveis, para que você não seja manipulado pela mídia e pelas igrejas pseudo-evangélicas da próxima vez que assistir a um noticiário na Rede Record a respeito de algum “ritual satânico”.
Em
primeiro lugar, vamos separar todos os nomes e todas as possíveis variáveis:
1) Umbanda
Na
Umbanda, não há sacrifícios de NENHUM tipo de animal em NENHUMA circunstância.
Se a matéria jornalistica menciona qualquer morte, então NÃO É UMBANDA.
Entendeu? Foi difícil? Quer que eu desenhe?
2) Candomblé
No
Candomblé existem as Obrigações, nos quais os animais são “sacro-oficiados”
para um Orixá. No candomblé, esta parte do ritual, denominada de sacrifício,
não é propriamente secreta; porém não se realiza senão diante de um reduzido
número de pessoas, todos fiéis da religião ou convidados.
Quem
faz o sacrifício é um sacerdote treinado e especializado, chamado Axogun, ou
Azogun ou Azogue (da onde vem nossa palavra “Açougue”) que tem uma função
extremamente importante na hierarquia do templo. O Axogun não pode deixar o
animal sentir dor ou sofrer de maneira nenhuma, porque senão a oferenda não
seria aceita pelo Orixá.
O
objeto do sacrifício, que é sempre um animal, muda conforme o Orixá ao qual é
oferecido; trata-se, conforme a terminologia tradicional, ora de um animal de
duas patas, ora de um animal de quatro patas (galinha, pombo, bode, carneiro,
pato…)
Esse
sacrifício não é apenas uma oferenda aos Orixás. Todas as partes do animal vão
servir de alimento, nada é jogado fora. O couro do animal é usado para encourar
os atabaques, o animal inteiro é limpo e cortado em partes; algumas partes são
preparadas para os Orixás e o restante é destinado aos demais. Normalmente há
uma festa no dia seguinte (o sacrifício é feito durante a madrugada e as carnes
preparadas durante a manhã para serem servidas no almoço – COZINHADAS (tem de
explicar tudo, porque vai que algum tosco acha que servem as carnes cruas?)).
TUDO é aproveitado: até a porção oferecida aos Orixás é posteriormente
distribuída entre os filhos da casa como o inché do Orixá.
É
usada para confraternização: unem-se os filhos a comer com o pai ou mãe,
havendo repartição do Axé gerado pelo Orixá. (após algum tempo que a comida
esteja no Peji ela fica impregnada pela energia do Orixá que está imantando
aquela festividade).
O
sacrifício no candomblé é a renovação do Axé, feito uma vez por ano para cada
Orixá da casa ou em circunstâncias especiais.
Os
animais usados nestas festas geralmente são criados em granjas e fazendas próprias,
livres e com cuidados especiais. Neste aspecto, não há absolutamente NENHUMA
diferença entre um fazendeiro mandar matar um boi para alimentar sua família em
um churrasco de alguma celebração e o ato do Sacrifício no Candomblé. Na
realidade, AMBAS as cerimônias possuem uma raiz ancestral comum.
3) Quimbanda
A
Quimbanda é a ramificação da Umbanda na qual atuam predominantemente os exus e
pombagiras, também chamados de “Guardiões” ou “povos de rua”. Eles fazem uso
das chamadas “forças de Esquerda”, a Coluna do Rigor na Árvore da Vida, o que
não significa que sejam malignos.
Como
os Exus precisam desfazer trabalhos de magia negra que muitas vezes envolvem
ameaças de mortes, doenças e ataques astrais graves, pode ser necessário, em
alguns casos mais extremos, o sacrifício de algum animal, para que a energia
vital seja usada como fio condutor daquele trabalho. Normalmente, é a própria
entidade quem faz o sacrifício e é cuidado para que o animal não tenha dor.
4) Satanismo
Satanismo
LaVeyano não envolve nenhum tipo de adoração ou sacrifício, usando “Satã” como
um símbolo dos valores carnais e terrenos, inerentes à natureza humana. Anton
LaVey fundou a primeira e maior organização de suporte religioso, a Church of
Satan (Igreja de Satã) em 1966, e escreveu as crenças e práticas satanistas
publicadas sob o título de The Satanic Bible (A Bíblia Satânica) em 1969.
Em
A Bíblia Satânica, Anton LaVey descreve Satã como uma força motivadora e
balanceadora na natureza. Satã também é descrito como “A Chama Negra”,
representando a personalidade e os desejos mais íntimos da pessoa. Satã é visto
como um sinônimo da natureza e, metaforicamente, com certos conceitos de um
deus ou divindade suprema. Em seu mais importante ensaio, Satanism: The Feared
Religion (Satanismo: A Religião Temida), o atual líder da Igreja de Satã, Peter
H. Gilmore, deixa isso bem claro:
“Os satanistas
não acreditam no sobrenatural, nem em Deus e nem no Demônio. Para o satanista,
ele é seu próprio Deus. Satã um símbolo do homem vivendo da forma como dita sua
natureza carnal e magnífica. A realidade por trás de Satã é simplesmente a
força obscura e evolucionária da entropia que permeia toda a natureza e dá os
meios para a sobrevivência e propagação inerente a todas as coisas vivas. Satã
não é uma entidade consciente a ser adorada, mas uma reserva de poder dentro de
cada ser humano para ser tomada à vontade. Assim, qualquer conceito de
sacrifício é rejeitado como uma aberração cristã — no Satanismo não há
divindades por quais se sacrificar”.
Basicamente,
são quase ateus somados a uma crítica pesada aos hipócritas cristãos mas, como
vocês podem ver, sem sacrifícios.
5) Voodoo
O
Voodoo verdadeiro é muito parecido com o Candomblé, com a diferença que, como
nas colônias caribenhas as famílias de escravos eram mantidas unidas, a
mitologia e o folclore são mais organizados, sem a necessidade do sincretismo
que houve no Brasil. No Voodoo, o templo é chamado Honfour e o sacerdote é
chamado de Hougan e trabalha com os Iwas (espíritos). A divindade criadora é
chamada de Bondye (“Bom Deus”) e os principais Iwas são papa Legba, Erzuli,
Ogou, Azaka, Marasa, Guede, Baron Samedi e outros, todos com correspondência
direta com os nossos orixás e linhas de trabalho (farei uma Árvore da Vida
sobre o Voodoo em breve). O único sacrifício que existe é feito em festas, nos
mesmos moldes que o Candomblé. Os animais são mortos para que sua carne seja
consumida nas festividades, sem desperdícios.
Resquícios
dos antigos rituais de sacrifício animal ainda são evidentes em muitas
culturas, como nas touradas ibéricas, o Kapparos no Yom Kippur, ou aos
procedimentos de abate ritual como o Shechita no Judaísmo, o Dabihah no Islamismo
e o Korbania na Igreja Ortodoxa Grega.
Todos estes procedimentos, porém, incluem o consumo dos animais como alimento.
Trata-se de dedicar aquela morta ao Plano Espiritual, respeitando e valorizando
a vida daquela criatura que irá nos nutrir…
Isto
colocado, agora começam as tosquices:
6) Kiumbanda ou
Magia Negra
São
grupos muito pequenos e, por razões óbvias, se mantém escondidos. Leis vindas
de evangélicos e ateus não vão detê-los. É tão ridículo quanto achar que
criminosos vão entregar suas armas em campanhas de desarmamento. Na Kiumbanda,
os magos usam sacrifício de animais em magia negra, utilizando-se da energia e
da dor (carga emocional primitiva) para ativar os rituais. Funciona da seguinte
maneira. Nos terreiros deste tipo estão os chamados Eguns, ou “fora-da-lei” que
trabalham como mercenários, vampirizando a energia vital dos seguidores dos
cultos. Ai existe uma espécie de “troca”. Dão algum poder para o chefe (que, na
verdade, é só o escravo que arruma mais escravos para a seita) como amarrações,
feitiços de proteção, ataques astrais e poderes mínimos enquanto sugam o que
conseguem da energia. Os “pais-de-santo” fazem essas macumbas para terceiros e
ganham um dinheiro com isso… são basicamente o lixo do lixo astral. Como estas
entidades não têm muito poder, precisam de sacrifícios para usar o poder das
outras criaturas em seus feitiços e também pedem sacrifícios para usarem a
energia para sobreviverem mais.
Estes
são os responsáveis pelos restos de animais que vocês vêem nas encruzilhadas,
resultados de magias de separação, amarrações ou ataques a outras pessoas.
Normalmente são utilizados para alimentar kiumbas que, depois, vão fazer a
separação do casal vítima dos feitiços.
7) Satanistas de
Facebook
Existem
grupos de pessoas desequilibradas mentalmente que se consideram “satanistas” e
alguns desses grupos até têm eguns e kiumbas como mentores (que sempre usam
nomes pomposos como “rei”, “maioral”, “chefe dos chefes”, etc.) e muitos usam
nomes cheios de firula, como “Lineamento Universal Superior” ou “Ordem dos Filhos
da Sabedoria” ou “Nova Ordem Mundial” mas que, na verdade, servem apenas como
pilhas energéticas e escravos astrais para demônios mequetrefes. Muitas vezes,
os chefes desses templos cobram mensalidades e ameaçam qualquer um que esteja
lá de morte, destruição e um monte de baboseiras se não cumprirem suas ordens.
Os membros desses grupos normalmente são pessoas fracas e desajustadas, que
procuram algum tipo de “poder” mas acabam apenas servindo como carcaça
comestível para os eguns. O satanista que me fez as ameaças patéticas, por
exemplo, participa da matança de bodes (não é ele quem mata porque ele tem
medo) e bebe sangue de galinha preta em seus rituais. É um pobre coitado
vampirizado, mas, na cabeça dele, é um “grande mago negro”.
Estes
grupos fazem sacrifícios em seus rituais, envolvendo sofrimento de animais.
8) Vodu pra Jacu
Também
conhecido como “Vodu de Hollywood”. Este é o Vodu que não existe! No começo do
século XIX, quando os negros começaram a se instalar no sul dos Estados Unidos,
na região da Louisiana, a Igreja começou a demonizá-los, tal qual os
evangélicos fazem hoje com a Umbanda. Alguns livros e textos foram lançados com
mentiras e bizarrices sobre as práticas dos negros, que incluíam bonecos com
espetos, crânios, caveiras, zumbis, negros pintando caveiras no rosto, tarots e
sacrifícios de todos os tipos. É uma miscelânea de maluquices de vilões de
filme do 007 que não se parece em nada com o verdadeiro Hoodoo ou Voodoo.
O
problema com isso é que muito traficante, para manter um aspecto sinistro e
“sobrenatural” em suas organizações, utilizou-se destas mentiras midiáticas
para encobrir assassinatos de rivais ou de desafetos com um verniz “religioso”,
para incutir terror nos supersticiosos.
Isso
é mais comum na América Central e Sul dos Estados Unidos. Ainda não temos
coisas assim aqui no Brasil e, de qualquer jeito, eles não matam animais, só
membros de outras gangues…
Existem
doentes mentais que sacrificam animais para magia negra? SIM. O que não podemos
fazer é sermos manipulados pela mídia para ligar estas mortes à religiões
afro-brasileiras bem estabelecidas, como querem seus detratores.
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