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sábado, 30 de junho de 2012

Sobre o Sacrifício Religioso de Animais

Por Marcelo Deldebbio
Sempre que falamos de “Sacrifício de Animais”, nos vem à cabeça a imagem de satanistas malignos torturando e matando gatos ou então macumbeiros bebendo cachaça e fumando charutos, torturando e matando bodes e galinhas à torto e à direito sem critério nenhum… pastores evangélicos e a mídia católica usam e abusam de mentiras e estereótipos para jogar a opinião pública contra as religiões afros, tentando ligar rituais de magia negra a seus cultos. No caso de animaizinhos, é pior ainda, porque usa da boa fé das pessoas que se comovem com o “sofrimento animal” para usá-las como massa de manobra religiosa.


A questão é muito ampla e seria bom separar todas as variáveis, para que você não seja manipulado pela mídia e pelas igrejas pseudo-evangélicas da próxima vez que assistir a um noticiário na Rede Record a respeito de algum “ritual satânico”.

Em primeiro lugar, vamos separar todos os nomes e todas as possíveis variáveis:

1) Umbanda
Na Umbanda, não há sacrifícios de NENHUM tipo de animal em NENHUMA circunstância. Se a matéria jornalistica menciona qualquer morte, então NÃO É UMBANDA. Entendeu? Foi difícil? Quer que eu desenhe?

2) Candomblé
No Candomblé existem as Obrigações, nos quais os animais são “sacro-oficiados” para um Orixá. No candomblé, esta parte do ritual, denominada de sacrifício, não é propriamente secreta; porém não se realiza senão diante de um reduzido número de pessoas, todos fiéis da religião ou convidados.
Quem faz o sacrifício é um sacerdote treinado e especializado, chamado Axogun, ou Azogun ou Azogue (da onde vem nossa palavra “Açougue”) que tem uma função extremamente importante na hierarquia do templo. O Axogun não pode deixar o animal sentir dor ou sofrer de maneira nenhuma, porque senão a oferenda não seria aceita pelo Orixá.
O objeto do sacrifício, que é sempre um animal, muda conforme o Orixá ao qual é oferecido; trata-se, conforme a terminologia tradicional, ora de um animal de duas patas, ora de um animal de quatro patas (galinha, pombo, bode, carneiro, pato…)
Esse sacrifício não é apenas uma oferenda aos Orixás. Todas as partes do animal vão servir de alimento, nada é jogado fora. O couro do animal é usado para encourar os atabaques, o animal inteiro é limpo e cortado em partes; algumas partes são preparadas para os Orixás e o restante é destinado aos demais. Normalmente há uma festa no dia seguinte (o sacrifício é feito durante a madrugada e as carnes preparadas durante a manhã para serem servidas no almoço – COZINHADAS (tem de explicar tudo, porque vai que algum tosco acha que servem as carnes cruas?)). TUDO é aproveitado: até a porção oferecida aos Orixás é posteriormente distribuída entre os filhos da casa como o inché do Orixá.
É usada para confraternização: unem-se os filhos a comer com o pai ou mãe, havendo repartição do Axé gerado pelo Orixá. (após algum tempo que a comida esteja no Peji ela fica impregnada pela energia do Orixá que está imantando aquela festividade).
O sacrifício no candomblé é a renovação do Axé, feito uma vez por ano para cada Orixá da casa ou em circunstâncias especiais.
Os animais usados nestas festas geralmente são criados em granjas e fazendas próprias, livres e com cuidados especiais. Neste aspecto, não há absolutamente NENHUMA diferença entre um fazendeiro mandar matar um boi para alimentar sua família em um churrasco de alguma celebração e o ato do Sacrifício no Candomblé. Na realidade, AMBAS as cerimônias possuem uma raiz ancestral comum.

3) Quimbanda
A Quimbanda é a ramificação da Umbanda na qual atuam predominantemente os exus e pombagiras, também chamados de “Guardiões” ou “povos de rua”. Eles fazem uso das chamadas “forças de Esquerda”, a Coluna do Rigor na Árvore da Vida, o que não significa que sejam malignos.
Como os Exus precisam desfazer trabalhos de magia negra que muitas vezes envolvem ameaças de mortes, doenças e ataques astrais graves, pode ser necessário, em alguns casos mais extremos, o sacrifício de algum animal, para que a energia vital seja usada como fio condutor daquele trabalho. Normalmente, é a própria entidade quem faz o sacrifício e é cuidado para que o animal não tenha dor.

4) Satanismo
Satanismo LaVeyano não envolve nenhum tipo de adoração ou sacrifício, usando “Satã” como um símbolo dos valores carnais e terrenos, inerentes à natureza humana. Anton LaVey fundou a primeira e maior organização de suporte religioso, a Church of Satan (Igreja de Satã) em 1966, e escreveu as crenças e práticas satanistas publicadas sob o título de The Satanic Bible (A Bíblia Satânica) em 1969.
Em A Bíblia Satânica, Anton LaVey descreve Satã como uma força motivadora e balanceadora na natureza. Satã também é descrito como “A Chama Negra”, representando a personalidade e os desejos mais íntimos da pessoa. Satã é visto como um sinônimo da natureza e, metaforicamente, com certos conceitos de um deus ou divindade suprema. Em seu mais importante ensaio, Satanism: The Feared Religion (Satanismo: A Religião Temida), o atual líder da Igreja de Satã, Peter H. Gilmore, deixa isso bem claro:

“Os satanistas não acreditam no sobrenatural, nem em Deus e nem no Demônio. Para o satanista, ele é seu próprio Deus. Satã um símbolo do homem vivendo da forma como dita sua natureza carnal e magnífica. A realidade por trás de Satã é simplesmente a força obscura e evolucionária da entropia que permeia toda a natureza e dá os meios para a sobrevivência e propagação inerente a todas as coisas vivas. Satã não é uma entidade consciente a ser adorada, mas uma reserva de poder dentro de cada ser humano para ser tomada à vontade. Assim, qualquer conceito de sacrifício é rejeitado como uma aberração cristã — no Satanismo não há divindades por quais se sacrificar”.

Basicamente, são quase ateus somados a uma crítica pesada aos hipócritas cristãos mas, como vocês podem ver, sem sacrifícios.

5) Voodoo
O Voodoo verdadeiro é muito parecido com o Candomblé, com a diferença que, como nas colônias caribenhas as famílias de escravos eram mantidas unidas, a mitologia e o folclore são mais organizados, sem a necessidade do sincretismo que houve no Brasil. No Voodoo, o templo é chamado Honfour e o sacerdote é chamado de Hougan e trabalha com os Iwas (espíritos). A divindade criadora é chamada de Bondye (“Bom Deus”) e os principais Iwas são papa Legba, Erzuli, Ogou, Azaka, Marasa, Guede, Baron Samedi e outros, todos com correspondência direta com os nossos orixás e linhas de trabalho (farei uma Árvore da Vida sobre o Voodoo em breve). O único sacrifício que existe é feito em festas, nos mesmos moldes que o Candomblé. Os animais são mortos para que sua carne seja consumida nas festividades, sem desperdícios.

Resquícios dos antigos rituais de sacrifício animal ainda são evidentes em muitas culturas, como nas touradas ibéricas, o Kapparos no Yom Kippur, ou aos procedimentos de abate ritual como o Shechita no Judaísmo, o Dabihah no Islamismo e o Korbania na Igreja Ortodoxa Grega. Todos estes procedimentos, porém, incluem o consumo dos animais como alimento. Trata-se de dedicar aquela morta ao Plano Espiritual, respeitando e valorizando a vida daquela criatura que irá nos nutrir…

Isto colocado, agora começam as tosquices:

6) Kiumbanda ou Magia Negra
São grupos muito pequenos e, por razões óbvias, se mantém escondidos. Leis vindas de evangélicos e ateus não vão detê-los. É tão ridículo quanto achar que criminosos vão entregar suas armas em campanhas de desarmamento. Na Kiumbanda, os magos usam sacrifício de animais em magia negra, utilizando-se da energia e da dor (carga emocional primitiva) para ativar os rituais. Funciona da seguinte maneira. Nos terreiros deste tipo estão os chamados Eguns, ou “fora-da-lei” que trabalham como mercenários, vampirizando a energia vital dos seguidores dos cultos. Ai existe uma espécie de “troca”. Dão algum poder para o chefe (que, na verdade, é só o escravo que arruma mais escravos para a seita) como amarrações, feitiços de proteção, ataques astrais e poderes mínimos enquanto sugam o que conseguem da energia. Os “pais-de-santo” fazem essas macumbas para terceiros e ganham um dinheiro com isso… são basicamente o lixo do lixo astral. Como estas entidades não têm muito poder, precisam de sacrifícios para usar o poder das outras criaturas em seus feitiços e também pedem sacrifícios para usarem a energia para sobreviverem mais.
Estes são os responsáveis pelos restos de animais que vocês vêem nas encruzilhadas, resultados de magias de separação, amarrações ou ataques a outras pessoas. Normalmente são utilizados para alimentar kiumbas que, depois, vão fazer a separação do casal vítima dos feitiços.

7) Satanistas de Facebook
Existem grupos de pessoas desequilibradas mentalmente que se consideram “satanistas” e alguns desses grupos até têm eguns e kiumbas como mentores (que sempre usam nomes pomposos como “rei”, “maioral”, “chefe dos chefes”, etc.) e muitos usam nomes cheios de firula, como “Lineamento Universal Superior” ou “Ordem dos Filhos da Sabedoria” ou “Nova Ordem Mundial” mas que, na verdade, servem apenas como pilhas energéticas e escravos astrais para demônios mequetrefes. Muitas vezes, os chefes desses templos cobram mensalidades e ameaçam qualquer um que esteja lá de morte, destruição e um monte de baboseiras se não cumprirem suas ordens. Os membros desses grupos normalmente são pessoas fracas e desajustadas, que procuram algum tipo de “poder” mas acabam apenas servindo como carcaça comestível para os eguns. O satanista que me fez as ameaças patéticas, por exemplo, participa da matança de bodes (não é ele quem mata porque ele tem medo) e bebe sangue de galinha preta em seus rituais. É um pobre coitado vampirizado, mas, na cabeça dele, é um “grande mago negro”.
Estes grupos fazem sacrifícios em seus rituais, envolvendo sofrimento de animais.

8) Vodu pra Jacu
Também conhecido como “Vodu de Hollywood”. Este é o Vodu que não existe! No começo do século XIX, quando os negros começaram a se instalar no sul dos Estados Unidos, na região da Louisiana, a Igreja começou a demonizá-los, tal qual os evangélicos fazem hoje com a Umbanda. Alguns livros e textos foram lançados com mentiras e bizarrices sobre as práticas dos negros, que incluíam bonecos com espetos, crânios, caveiras, zumbis, negros pintando caveiras no rosto, tarots e sacrifícios de todos os tipos. É uma miscelânea de maluquices de vilões de filme do 007 que não se parece em nada com o verdadeiro Hoodoo ou Voodoo.
O problema com isso é que muito traficante, para manter um aspecto sinistro e “sobrenatural” em suas organizações, utilizou-se destas mentiras midiáticas para encobrir assassinatos de rivais ou de desafetos com um verniz “religioso”, para incutir terror nos supersticiosos.
Isso é mais comum na América Central e Sul dos Estados Unidos. Ainda não temos coisas assim aqui no Brasil e, de qualquer jeito, eles não matam animais, só membros de outras gangues…

Existem doentes mentais que sacrificam animais para magia negra? SIM. O que não podemos fazer é sermos manipulados pela mídia para ligar estas mortes à religiões afro-brasileiras bem estabelecidas, como querem seus detratores.

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