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quinta-feira, 30 de junho de 2011

Poesia e Verso

Por Manuel Bandeira
Um dia, ao começar a escrever um livro didático sobre literatura, tive que dar uma definição da poesia e embatuquei. 
Eu, que desde os dez anos de idade faço versos; eu, que tantas vezes sentira a poesia passar em mim como uma corrente elétrica e afluir aos meus olhos sob a forma de misteriosas lágrimas de alegria: não soube no momento forjar já não digo uma definição racional dessas que, segundo a regra da lógica, devem convir a todo o definido e só ao definido, mas uma definição puramente empírica, artística, literária. 
No aperto me socorri de Schiller, em quem o crítico era tão grande quanto o poeta, e disse com ele: "Poesia é a força que atua de maneira divina e inapreendida, além e acima da consciência."
Sabeis o que é atuar de maneira divina? 
Confesso lisamente que não sei. Mas conheço da poesia, por experiência própria, essa maneira inapreendida de ação: nunca pude explicar, em muitos casos, a emoção que me assaltava ao ouvir ou ao ler certos versos, certas combinações de palavras. 
A propósito, vou contar-vos um anedota. 
Havia na Avenida Marechal Floriano um hotel que se chamava Península Fernandes. 
Toda vez que eu passava por ali e via na tabuleta aquele nome Hotel Península Fernandes, sentia não sei que pequenino alvoroço, — alvoroço em suma de qualidade poética. 
E ficava intrigadíssimo. 
Por que aquele hotel se chamava Península Fernandes? 
Uma tarde meu primo Antônio Bandeira, igualmente invocado pelo estranho nome, não se conteve, subiu as escadas e foi falar ao proprietário, que era um português terra-a-terra e sem nenhuma fumaça de literatura.
— O Sr. me desculpe a curiosidade, mas por que é que o seu hotel se chama Península Fernandes?
— Muito simples, respondeu o homem. Fernandes porque é o meu nome, e P'nínsula porque é bonito!
O nome estava realmente explicado, mas a emoção poética não: atuava de maneira inapreendida.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Máquina de Dobrar Camisas

Vi uma dessa no seriado Big Bang Theory... Tô precisando de uma. Acho que vou fazer.


terça-feira, 28 de junho de 2011

Os Três Irmãos


Durante todo o tempo do antigo primário e do ginásio eu tinha um hábito com relação às aulas de português. Antes de começar o ano letivo, logo que minha mãe comprava os livros (não tinha essa de o Governo dar livros...) eu lia todos os textos. O texto de hoje eu não li pela primeira vez num livro da escola, foi num antigo livrinho de português que eu ganhei (e tenho até hoje) com escritos curtos de autores famosos. Acho que é uma daquelas histórias formadoras de caráter. Pelo menos para mim, assim foi. Espero que possa lhes inspirar alguma coisa também... Com qual dos três você se identifica?


***


Por Viriato Correia
Os três irmãos Hajaz, Jacó e Abul saíram um dia da casa paterna em procura do Reino Feliz, que se dizia ficar muito longe, muito para além dos vaiados e penedias natais.
Andaram longamente pelo deserto, durante meses e, um dia, inesperadamente, eis que deparam com um imenso penedo inacessível, que lhes fechava por inteiro o caminho.
Pararam os três. O remédio ali era voltar. Mas, não ficava bem aos três homens, todos moços, recuar de um intento em que tanto se empenharam.
— Que dizes, Jacó? perguntou Abul.
— Acho que nosso pai se envergonharia de nós, se lhe entrássemos em casa, mostrando que não procuramos vencer um obstáculo.
— A tua opinião, Hajaz?
— Nós mesmos nos devemos sentir envergonhados se tivermos que recuar.
— É a minha opinião. Eu prefiro morrer aqui, junto deste penedo áspero, a ter que voltar as costas.
Eram três gênios inteiramente diversos, esses três irmãos.
Hajaz era vivo, alegre, sinuoso, olhar agudo, voz risonha e uma centelha amável nos olhos.
Jacó, mais concentrado, mais silencioso, olhos pacientes e voz resignada.
Abul, o mais forte de todos, fala rude, gestos tempestuosos e maneiras agressivas.
Quando alguém se opunha a Hajaz, ele, em vez de zangar-se, sorria; em vez de agredir, acalmava o adversário.
Jacó calava-se, meditando, e esperava paciente mente que a hostilidade passasse.
Abul, esse rompia em gestos selvagens, em gritos e berros fragorosos.
Diante daquele penedo que lhes fechava o caminho ao Reino Feliz, os três puseram-se a pensar longamente.
— Que devemos fazer? - Perguntou Abul, em fúria.
Falou Hajaz:
— Eu acho que devemos caminhar contornando este penedo, a ver se encontramos uma brecha, uma saída qualquer.
Falou Jacó:
— Eu penso que devemos conseguir um meio de galgar, de subir o penedo.
Berrou Abul:
— Vocês estão loucos! Sou de parecer que devemos pôr o penedo abaixo.
— Levaríamos toda a vida e não conseguiríamos! - Exclamou Hajaz.
— Seria um trabalho inútil para o qual não temos forças, observou Jacó.
— Vocês são fracos e eu não sou, rugiu Abul. Os fortes vencem pela força. Sempre ouvi dizer que as dificuldades se põem abaixo.
Falou Jacó:
— Eu penso que as dificuldades deve a gente vencê-las pacientemente.
Falou Hajaz:
— Sou de parecer que a gente deve contornar as dificuldades.
— Façam vocês o que quiserem. Vou empregar os meus braços, a minha força, para derrubar o penedo.
Separam-se.
Hajaz começou a percorrer a base da montanha de pedra, contornando o flanco que lhe ficava à frente, olhar muito agudo, a ver se encontrava uma fenda, uma brecha, uma passagem.
Jacó entrou na floresta e começou calmamente a derrubar árvores, a tecer cordas, a fim de construir uma longa escada que lhe permitisse transpor o penedo.
E Abul? Esse suava, noite e dia, de músculos entesados, cavando, cavando, na fúria de deslocar e derrubar a montanha formidável.
O primeiro a chegar ao Reino Feliz foi Hajaz. O segundo foi Jacó. Abul ainda lá não chegou. Está martelando, martelando, penosamente o penedo inabalável.
Hajaz é a habilidade, a inteligência, que sempre contorna os obstáculos. Jacó é a tenacidade paciente, Abul, a teimosia, que se julga com forças de abalar montanhas.
A inteligência vence imediatamente. A paciência custa, mas acaba vencendo. A teimosia não vence nunca.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Uma crônica do "Analista de Bagé" (Ou "O Zen com Joelhaço")


Por Luiz Fernando Veríssimo

Existem muitas histórias sobre o analista de Bagé mas não sei se todas são verdadeiras. Seus métodos são certamente pouco ortodoxos, embora ele mesmo se descreva como "freudiano barbaridade". E parece que dão certo, pois sua clientela aumenta. Foi ele que desenvolveu a terapia do joelhaço.
Diz que quando recebe um paciente novo no seu consultório a primeira coisa que o analista de Bagé faz é lhe dar um joelhaço. Em paciente homem, claro, pois em mulher, segundo ele, "só se bate pra descarregá energia". Depois do joelhaço o paciente é levado, dobrado ao meio, para o divã coberto com um pelego.
- Te abanca, índio velho, que tá incluído no preço.
- Ai - diz o paciente.
- Toma um mate?
- Na-não... - geme o paciente.
- Respira fundo, tchê. Enche o bucho que passa.
O paciente respira fundo. O analista de Bagé pergunta:
- Agora, qual é o causo?
- É depressão, doutor.
O analista de Bagé tira uma palha de trás da orelha e começa a enrolar um cigarro.
- Tô te ouvindo - diz.
- É uma coisa existencial, entende?
- Continua, no más.
- Começo a pensar, assim, na finitude humana em contraste com o infinito cósmico...
- Mas tu é mais complicado que receita de creme Assis Brasil.
- E então tenho consciência do vazio da existência, da desesperança inerente à condição humana. E isso me angustia.
- Pois vamos dar um jeito nisso agorita - diz o analista de Bagé, com uma baforada.
- O senhor vai curar a minha angústia?
- Não, vou mudar o mundo. Cortar o mal pela mandioca.
- Mudar o mundo?
- Dou uns telefonemas aí e mudo a condição humana.
- Mas... Isso é impossível!
- Ainda bem que tu reconhece, animal!
- Entendi. O senhor quer dizer que é bobagem se angustiar com o inevitável.
- Bobagem é espirrá na farofa. Isso é burrice e da gorda.
- Mas acontece que eu me angustio. Me dá um aperto na garganta...
- Escuta aqui, tchê. Tu te alimenta bem?
- Me alimento.
- Tem casa com galpão?
- Bem... Apartamento.
- Não é veado?
- Não.
- Tá com os carnê em dia?
- Estou.
- Então, ó bagual. Te preocupa com a defesa do Guarani e larga o infinito.
- O Freud não me diria isso.
- O que o Freud diria tu não ia entender mesmo. Ou tu sabe alemão?
- Não.
- Então te fecha. E olha os pés no meu pelego.
- Só sei que estou deprimido e isso é terrível. É pior do que tudo.
Aí o analista de Bagé chega a sua cadeira para perto do divã e pergunta:
- É pior que joelhaço?
Retirado de: http://literal.terra.com.br/verissimo/biobiblio/ostipos/analista/analista_cronica.shtml?biobiblio2

***
Guardadas as devidas proporções, essa história de humor (que me perdoem os críticos e puristas em geral) tem muitas semelhanças com um Koan Zen-Budista atribuído a Bodhidharma  (o monge budista que introduziu o Zen na China vindo da Índia no início do século V) e seu discípulo Hui-Ko:

"Hui-ko procurou Bodhidharma, primeiro patriarca do zen chinês e lhe disse:

- Mestre, não tenho paz na minha mente. Pacifica minha mente.
- Traz tua mente à minha presença e eu a pacifico.
- Mas, mestre,  quando busco minha própria mente, não consigo encontrá-la, diz Hui-ko.
E Bodhidharma então respondeu:
- Pronto! Então já pacifiquei tua mente."

domingo, 26 de junho de 2011

Não Aguento

Por Artur Xexéu
Eu não aguento mais pessoas que começam qualquer frase com a expressão “Na verdade...” Nem aquelas que respondem qualquer pergunta dizendo “Com certeza!”. Nem mesmo as que, antes de terminar um pensamento, acrescentam um “enfim” ao discurso.

Não aguento aqueles que, diante do caos em qualquer aeroporto, comentam “Imagina como vai ser em 2014”. Ou gente que, em qualquer engarrafamento de trânsito, suspira: “Imagina como vai ser em 2014.” Ou os moradores do Rio que, diante de um bueiro entupido, preveem: “Imagina como vai ser em 2014”.

Eu não aguento mais atrizes de novela que analisam seus personagens dizendo “Foi um presente do Gilberto” (ou do Maneco, ou do Aguinaldo, ou da Maria Adelaide). Ou aquelas que, tentando definir o parceiro ideal, afirmam que “humor é fundamental”. Não aguento as que nunca protagonizam a novela das oito, mas fingem que não se importam porque “é muito melhor fazer a vilã”. Ou ainda as que celebram a profissão de atriz porque, assim, podem “viver muitas vidas”.

Não aguento participantes da “Dança dos famosos” que dizem que a disputa provou sua “capacidade de superação”. Nem jogadores de futebol que, após a vitória de seu time, valorizam sua “capacidade de superação”. Muito menos modelos que após uma ida e volta na passarela do Fashion Rio sentem-se aliviadas por sua “capacidade de superação”.

Eu não aguento mais comentaristas de moda na televisão analisando o “look” dos desfiles. Nem a supervalorização dos seriados da TV americana. E atores do palco agradecendo “aos deuses do teatro”.

Eu não aguento mais prefeitos e governadores justificando atrasos nas obras porque  “o edital está em fase de finalização”. Eu não aguento políticos do PT pedindo que a oposição “não politize” o escândalo mais recente do partido. Nem os ministros do Governo chamando a presidente Dilma de “presidenta”.

Eu não aguento mais ninguém dizendo que as redes sociais são “uma poderosa ferramenta de comunicação”. Não aguento filmes em 3D. Nem gente que se acha na obrigação de comprar o iPhone 6, quando lê o anúncio do lançamento para breve do iPhone 5.

Não aguento mais médicos diagnosticando como “virose” tudo que eles não sabem bem o que é. Nem pesquisas científicas amaldiçoando o ovo e seus efeitos no colesterol, anos depois de o ovo ter sido abençoado por pesquisas científicas porque, afinal, o ovo tem bom colesterol, apesar de, anos antes, outras pesquisas já terem amaldiçoado o ovo etc etc etc.

Eu não aguento mais a Regina Casé bancando a simpática. Nem a comoção nacional em torno do fim do Exalta Samba. Muito menos algum artista jovem que recebe prêmio, gritando na boca de cena “Valeu, galera!”. Eu não aguento mais o Luan Santana.
Coluna da Revista O Globo - 19/06/2011)


***
Essa é uma reflexão psico-neurótica e altamente politicamente incorreta, mas ele está coberto de razão e eu concordo em gênero número e grau com a maioria das coisas que ele diz e mais... poderia acrescentar algumas outras que não foram citadas. 

sábado, 25 de junho de 2011

Anti-catequese

Vários fatores me  fizeram deixar de ser católico, embora reconheça que essa é a matriz mais importante de minha formação religiosa até hoje. Entre esses fatores, algo que muito cedo foi relevante para iniciar o meu afastamento, foram as malfadadas aulas de catecismo que tive de assistir pra fazer a “Primeira Comunhão”. Eram recheadas com altas doses de contrição forçada pelos “pecados veniais e capitais” que um garoto de onze anos, nerd e meio bobo, pudesse ter. As “catequistas” (professoras da escola dominical) repetiam uma cantilena de culpa e castigo que ao invés de me atrair para “o seio da Santa Madre Igreja” me empurrava cada vez mais para longe. Hoje abraço uma filosofia de vida que não trabalha com culpa (ou pecado original) e aposta na estrita responsabilidade de cada um sobre as coisas que acontecem em suas vidas. Não desacredito em anjos ou demônios, mas não atribuo a uns ou a outros influências determinantes para os êxitos e fracassos de minha vida, por que  procuro manter minha trajetória pessoal reta como uma flecha. Uma outra coisa que contribuiu para que eu tomasse distância do catolicismo foi a influência nefasta de um livro que li ainda muito jovem e que, como verão, não era (e não é) uma pedagogia muito efetiva para atrair adeptos. Ele baseia-se no catecismo de Pio X de 1905. 
A Wikipédia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Catecismo_de_S%C3%A3o_Pio_X) assim o descreve:

“O Catecismo de São Pio X é um pequeno e simples catecismo, escrito pelo Papa São Pio X em 1905, com o importante objetivo de popularizar o ensino do catecismo na Igreja Católica e tornar os católicos mais informados e conhecedores da sua fé e doutrina. Este catecismo tinha também a função de resumir o Catecismo Romano, que foi um produto importante do Concílio de Trento.

Este catecismo, publicado inicialmente em italiano, adopta o clássico "método dialógico de perguntas e respostas" para expor o essencial da doutrina católica, fornecendo por isso um conhecimento teológico básico para todos os católicos. Este método, aliado à sua "linguagem clara e concisa", tornou-se por isso muito mais adequado à formação dos jovens e adultos católicos do que o Catecismo Romano.

Em 2003, o então cardeal Joseph Ratzinger, que actualmente tornou-se no Papa Bento XVI, afirmou que o Catecismo de São Pio X "tinha como características a simplicidade de exposição e a profundidade de conteúdos".

Este catecismo, com cerca de 1000 perguntas e respostas, é estruturado da seguinte maneira:
Introdução - onde está exposto as principais orações e fórmulas de doutrina católica;
Lição Preliminar: Da Doutrina Cristã e suas partes principais;
Primeira Parte: Do Símbolo dos Apóstolos, chamado vulgarmente o Credo;
Segunda Parte: Da Oração;
Terceira Parte: Dos Mandamentos da Lei de Deus e da Igreja;
Quarta Parte: Dos Sacramentos;
Quinta Parte: Das virtudes principais e de outras coisas que o cristão deve saber - nesta última parte, está exposto a doutrina sobre as virtudes, o pecado, as bem-aventuranças, a Tradição apostólica (oral e escrita), as boas obras (com particular destaque às obras de misericórdia) e os novíssimos”.

***

Se quiser ler o catecismo na íntegra vai aqui:

***

O livro em questão é “Na Escola de Jesus: O catecismo de Pio X Explicado por Meio de 190 Quadros Artísticos” publicado a partir de 1955 pela “Edições Paulinas”.



 Eu o li todo mais de uma vez, mas algumas imagens eu levei algum tempo para poder ver sem ter pesadelos. Algumas delas vocês verão abaixo. Tenham em mente o impacto delas sobre a mente de um jovem rapaz impressionável... Tamanha carga de terrorismo religioso definitivamente tiveram em mim um resultado contrário ao que era esperado. Vejam alguns exemplos:


Que animal será esse? Baleia não é. Uma baleia não tem DOIS esguichos! Dever ser algum ser do mal...

Tinha medo dessa figura à direita da imagem ...

E dessa caída no chão.

A ameaça aos pecadores com o fogo eterno!

Atentem para a mão em forma de garra que se insinua a esquerda da imagem... 

O "blasfemador punido": parece filme do Tarantino...

Essa também...  Santo Anselmo sem cabeça.









sexta-feira, 24 de junho de 2011

Por Conta Disso e Daquilo

Por conta do rumo das coisas, vou embora.
Não vou pra Pasárgada porque não sei o caminho
Vou me exilar logo ali, não vejo a hora;
mas vou pra voltar porque sempre andei sozinho

Por conta do rumo das coisas, saio triste.
Queria ficar, meu amor, mas tô cansado.
Você que é mais forte que eu, veja se resiste;
um dia eu volto pra ficar do seu lado.

Por conta do rumo das coisas, vou agora.
Não vou pra Pasárgada, pois desconheço o rei.
Vou com saudade dos tempos de outrora;
cantava, sorria e hoje... Eu já nem sei.

Por conta do rumo das coisas, saio cedo.
Queria ficar mais um pouco... Acabou!
Um dia, quem sabe? a alegria vence o medo
e a gente vai contar sorrindo o que passou.

Por conta do rumo das coisas, amor, adeus.
Não vou pra Pasárgada atrás de aventura.
Vou pra sonhar os meus sonhos e os seus
e voltar porque não sei viver sem sua ternura.
 (Antônio Luiz Miranda)


Esse é mais um trabalho do colega, professor de matemática, Toninho; publicado na "Coletânea de Poemas dos Profissionais de Educação" da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro e  editado pelo Empresa Municipal de Artes gráficas/Imprensa da Cidade no ano de 1998.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

A Fivela de Ouro

Uma das lembranças mais antigas e significativas que eu tenho dos tempos de escola primária foi quando a professora, Dona Solange, deu para a turma um texto para ler numa daquelas clássicas folhas escritas em tinta azul e cheirando a álcool que saía dos jurássicos mimeógrafos que eram usados nas escolas do meu tempo. Devia ser uma versão antiga desse que está aqui embaixo. Esse texto me marcou muito por que, olhando retrospectivamente, foi o primeiro contato que eu tive com um pensamento que iria nortear e moldar minha personalidade ao longo dos anos. Uma ideia que abracei no Taoismo (minha filosofia pessoal) e no Zen-Budismo (uma fusão do taoismo com o budismo que floresceu na China e no Japão) que gosto muito de estudar; e que versa  sobre a atenção que devemos ter nos detalhes da vida e de tentar, na medida do possível,  ficar consciente do aqui e agora onde estão as sementes de tudo. Na primeira leitura daquele texto tive medo de que minha vida fosse como a daquele homem descrito e isso ficou gravado fundo no meu ser. Redescobri essa versão na Internet e queria partilhar com vocês, na esperança  de que, após lê-la, não olhem para baixo e se deem conta que sua fivela está amarela...

*** 

Na antiga Índia um rico mercador, buscando realizar o grande sonho de sua vida, decidiu viajar pelo mundo em busca da “Pedra Filosofal”.

Longe de ser uma pedra comum, o famoso amuleto possuía, diziam, propriedades mágicas fabulosas. Entre tantas, teria o dom de transformar qualquer metal em ouro, bastando tocá-lo com a referida pedra, para transformá-lo no mais valioso dos metais.

Tal expectativa norteou toda sua vida daí para frente, muniu-se de um cinto com fivela de ferro e com ele percorreu toda Índia. Pelos caminhos que andava, recolhia pedras de todos os tipos e tamanhos e tocava com cada uma delas a fivela do cinto, com a expectativa ansiosa de transformá-la em ouro.

Após longos anos, havia percorrido milhares de quilômetros, tendo tido oportunidade tocar milhares de pedras em seu cinto, sem qualquer resultado. Sentia-se cansado, seu rosto vincado pela desesperança, pela longa e infrutífera jornada que no tempo, transformara-se num ritual automático e destituído de qualquer sentido afora pegar as pedras, tocá-las na fivela de seu cinto e abandoná-las no caminho. Não desistia, seguia em seu caminho solitário, persistia em seu sonho.

Certo dia, após uma caminhada de várias horas, parou à sombra de uma árvore para descansar. Sua cabeça inclinou-se para frente e seus olhos pousaram instintivamente no cinto, na fivela. Imediatamente levantou-se num salto e invadido por imenso espanto, confirmou que afixado ao seu cinto de couro pendia uma fivela de OURO.

Em algum recanto do longo caminho trilhado, suas mãos haviam recolhido a ambicionada pedra. Sem se dar conta, havia com ela tocado a fivela de ferro que imediatamente se transformou em ouro.

Na fria rotina tantas vezes repetida, seus gestos tinham perdido o sentido da observação dos atos que realizara, não percebera a transformação ocorrida, prosseguiu sua marcha, devolvendo num ponto da caminhada, ao pó da estrada, a preciosa jóia que encontrara.

De seus olhos brotaram copiosas lagrima até o sol sumir no horizonte. Dormiu um sonho agitado até os albores do amanhecer. Levantou-se, limpou com as mãos o pó das calças e caminhou no sentido inverso que tinha feito até então. Do pequeno alforge, retirou uma fivela de ferro, trocando-a pela que de ouro no cinto havia.

Retomou sua marcha disposto a percorrer toda Índia, se preciso fosse, tocando cada pedra que recordava haver encontrado na nova fivela, disposto a não desperdiçar como muitos de nós, Pedras Filosofais que encontramos em nossas vidas.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Homem É Um Bicho Bobo Desde Sempre...

DECLARAÇÃO
Por Manuel Antônio de Almeida
Luisinha estava no vão de uma janela a espiar para a rua pela rótula; Leonardo aproximou-se tremendo, pé ante pé, parou e ficou imóvel como uma estátua atrás dela que, entretida para fora, de nada tinha dado fé. Esteve assim por longo tempo, calculando se devia falar em pé ou se devia ajoelhar-se. Depois fez um movimento como se quisesse tocar no ombro de Luisinha, mas retirou depressa a mão. Pareceu-lhe que por aí não ia bem; quis antes puxar-lhe pelo vestido, e ia já levantando a mão quando também se arrependeu. Durante todos estes movimentos o pobre rapaz suava a não poder mais. Enfim, um incidente veio tirá-lo da dificuldade.
Ouvindo passos no corredor, entendeu que alguém se aproximava, e tomado de terror por se ver apanhado naquela posição, deu repentinamente dois passos para trás, e soltou um — ah! — muito engasgado. Luisinha, voltando-se deu com ele diante de si, e recuando espremeu-se de costas contra a rótula: veio-lhe também outro — ah! — porém não lhe passou da garganta, e conseguiu apenas fazer uma careta.
A bulha dos passos cessou sem que ninguém chegasse à sala; os dois levaram algum tempo naquela mesma posição, até que o Leonardo, por um supremo esforço, rompeu o silêncio e com voz trêmula e em tom o mais sem graça que se possa imaginar perguntou desenxabidamente:
— A senhora... sabe... uma coisa?
E riu-se com uma risada forçada, pálida e tola. Luisinha não respondeu.
Êle repetiu no mesmo tom.
— Então... a senhora... sabe ou... não sabe?
E tornou a rir-se do mesmo modo.  Luisinha conservou-se muda.
— A senhora bem sabe... é porque não quer dizer ...
Nada de resposta.
— Se a senhora não ficasse zangada... eu dizia...
Silêncio.
— Está bom... eu digo sempre... mas a senhora fica ou não fica zangada?
Luisinha fez um gesto de quem estava impacientada.
— Pois então eu digo... a senhora não sabe... eu... eu lhe quero... muito bem.
Luisinha fez-se cor de uma cereja; e fazendo meia volta à direita, foi dando as costas ao Leonardo e caminhando pelo corredor. Era tempo, pois alguém se aproximava.
Leonardo viu-a ir-se, um pouco estupefato pela resposta que ela lhe dera, porém, não de todo descontente: seu olhar de amante percebera que o que se acabava de passar não tinha sido totalmente desagradável a Luisinha.
Quando ela desapareceu, soltou o rapaz um suspiro de desabafo e assentou-se, pois se achava tão fatigado como se tivesse acabado de lutar braço a braço com um gigante.

***

Filho de pais humildes, Manuel Antônio de Almeida nasceu no Rio de Janeiro em 1831. Formou-se em Medicina, porém não exerceu a profissão porque era jornalista por excelência.
Entre 1852 e 1853 publicou, em folhetins, a obra "Memórias de um Sargento de Milícias". Em 1857 foi nomeado diretor da Tipografia Nacional. Nessa função, ficou conhecido por ter dado emprego a um jovem pobre e mestiço chamado Machado de Assis. Em 1861 morreu tragicamente no naufrágio do navio Hermes.
 É considerado um homem de transição entre o Romantismo e o Realismo. Isso se dá porque sua obra, apesar de apresentar convenções do Romantismo, já traz algumas características do movimento que estava por vir, como, por exemplo, os personagens não idealizadas, ou seja, mais próximos do real, e linguagem mais simples e popular, se comparada, à outros escritores do mesmo período.
“Memórias de um Sargento de Milícias”, de 1852, foi seu único livro. Retrata as classes média e baixa, algo muito incomum para a época, na qual os romances retratavam os ambientes aristocráticos. A experiência de ter tido uma infância pobre influenciou Manuel Antônio de Almeida no desenvolvimento de sua obra.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Cuzco En El Peru

Esse é um clipe musical apresentado no final do programa Comédia MTV retirado do YouTube, em que Marcelo Adnet canta uma bela canção declarando seu amor por uma lhama que o abandonou e chora suas mágoas mascando folhas de coca...





Abaixo  a letra original retirada de: http://www.vagalume.com.br/comedia-mtv/cancao-do-peru.html  está  traduzida pelo Google Tradutor revisada por mim com a explicação de alguns termos próprios da América Latina usados na canção que atesta a genialidade do autor (os grifos em itálico são meus).  


TRADUÇÃO:

Canção do Peru

Sentado nas montanhas do Peru
bebendo um chá
apreciando os Andes[1]
meu poncho para esquentar
o vento a soprar

Quando eu sinto o meu Cuzco no Peru[2]
A neve caindo
Reunindo-se nos cumes
e a neblina a encobrir
me custa a sorrir
me faz recordar
De ti meu lhama[3]
meu grande amor
me abandonou
por que não me chama
Vou correndo pois
Me cospes depois[4]
e fico a esperar
nesse lugar
Meu Cuzco no Peru

Creio que vou mascar...

Quando eu mastigo folhas de coca[5]
Eu começo a imaginar
Como seria sobrevoar
As cordilheiras
para te encontrar

Quando eu bebo a ayahuasca[6]
Sinto que posso voar
Sobre as costas de um condor[7]
até te avistar

Lalalalalalalalalalala

Eu gosto de no Peru sentar

Lalalalalalalalalalala

Com pisco[8] nós brindaremos

Seus beijos tem gosto de ceviche[9]
olhos de amêndoa que eu não posso evitar

Sem você eu fujo para a Amazônia
Equador ou Bogotá
Sem você eu fujo para a Amazônia
Equador ou Bogotá

Lalalalalalalalalalala 

Estamos loucos no Peru
E para terminar a canção
Um solo de siku[10]

A noite está chegando
temos que ir

contigo meu lhama
vou sonhar

Lalalalalalalalalalala 

Eu gosto de no Peru sentar

Lalalalalalalalalalala 

Com pisco nós brindaremos

Seus beijos tem gosto de ceviche
olhos de amêndoa que eu não posso evitar

Sem você eu fujo para a Amazônia
Equador ou Bogotá

Sem você eu fujo para a Amazônia
Equador ou Bogotá

Lalalalalalalalalalala 




[1] A Cordilheira dos Andes é uma vasta cadeia montanhosa formada por um sistema contínuo de montanhas ao longo da costa ocidental da América do Sul. (Fonte: Wikipédia)


[2] Cuzco (em espanhol Cuzco ou Cusco, em quíchua Qosqo ou Qusqu) é uma cidade no Peru situada no sudeste do Vale de Huatanay ou Vale Sagrado dos Incas, na região dos Andes. (Fonte: Wikipédia)

[3] e [4] Lhama ou lama (Lama glama), é um mamífero ruminante da América do Sul, da família dos camelídeos, género Llama. Tem pelagem longa e lanosa, e é domesticado para a utilização no transporte de carga, produção de lã, carne e couro. Foi domesticado pelo povo inca, tendo sido muito importante para os mesmos. Vivem na Cordilheira dos Andes, onde as temperaturas são baixas. Assim, as pelagens servem para protegê-los do frio, além de proteger o seu corpo de arranhões e outros ferimentos. É conhecida pelo seu estilo calmo, muitas vezes andando devagar, porém pode se irritar facilmente, assim foi considerada o oitavo animal mais irritável do mundo, segundo o canal Animal Planet. Quando irritada ou para chamar a atenção, espirra seu muco [cospe] na direção do objeto de sua irritação. A lhama alimenta-se de capim e mato. Estes animais medem de 1,40 m a 2,40 m contando com a cauda 25cm e chega a pesar 150Kg. [Marcelo Adnet faz um trocadilho como a palavra “lhama”, que significa a designação do animal e o termo “lhama” do verbo chamar em espanhol.] (Fonte: Wikipédia)

[5] Mascar a folha da coca (planta narcótica da família das Erythroxylesd, indígena do Peru com nome científico Erythoxylon coca) é de grande importância para os povos andinos. O arbusto conhecido por este nome que os peruanos chamam “ipatú”, pode atingir de 1 a 3 metros de altura.
Em estado selvagem, é encontrado nos Andes até dois mil metros de altura. Os incas exaltavam excessivamente este arbusto e utilizavam a folha como moeda. Na antiga Colômbia, os sacerdotes do Sol mastigavam e queimavam folhas de coca em honra a divindades. Os peruanos e bolivianos mascam as folhas, assim resistem à fadiga e ao sono, como também aos jejuns prolongados. Mascar a folha da coca também contribui para uma boa digestão e para desfazer a sensação de desconforto causada pelo excesso de altitude. Há um porém: o “chacchar” produz um sumo que deixa os dentes com a coloração esverdeada e a boca ligeiramente adormecida. (Fonte: http://www.sairdobrasil.com/2009/03/01/o-habito-de-mascar-folhas-de-coca-muito-comum-no-peru/)

[6] Ayahuasca é uma bebida produzida a partir de duas plantas amazônicas: Banisteriopsis caapi e Psychotria viridis. O nome significa cipó dos mortos. Utilizada pelos incas, a “hoasca” é utilizada tradicionalmente nos países como Peru, Equador, Colômbia, Bolívia e Brasil e ainda por pelo menos setenta e duas diferentes tribos indígenas da Amazônia. Segundo os relatos dos usuários, a hoasca produz uma ampliação da percepção que faz com que se veja nitidamente a imaginação e acesse níveis psíquicos subconscientes e outras percepções da realidade, estando sempre consciente do que acontece — as chamadas mirações. Os adeptos consideram esse estado como supramental "desalucinado" e de "hiperlucidez" ou êxtase. (Fonte: Wikipédia)

[7] Condor (em quíchua kúntur) é o nome dado a duas espécies de aves, pertencentes a diferentes gêneros, da família dos catartídeos, ordem falconiformes. Aves de porte avantajado, coloração preta com colar branco no pescoço, asas com manchas brancas, cabeça, nuca e pescoço nus. O condor-dos-andes (Vultur gryphus) é o símbolo nacional da Colômbia, Equador, Bolívia e Chile e integra os brasões oficiais destes países, além de cumprir um importante papel no folclore e na mitologia das regiões andinas da América do Sul. (Fonte: Wikipédia)

[8] O Pisco é o nome de duas variedades diferentes de aguardente de uva, produzidas no Peru e no Chile . É baseado fundamentalmente na destilação do mosto proveniente de uvas. (Fonte: Wikipédia)

[9] Ceviche, cebiche ou seviche é um prato de origem peruana baseado em peixe cru marinado em suco de limão ou outro citrico. Pode servir-se como entrada, acompanhado com pipoca, bolachas de água e sal, tortilhas mexicanas, batatas fritas ou pão. Ou pode ser o prato principal duma refeição, acompanhado com batatas “portuguesas” ou doces cozidas, ou milho cozido. (Fonte: Wikipédia)

[10] O Siku (em Quíchua: antara, Aymara : siku, também "Sicu", "Sicus", "Zampolla" ou Espanhol zampoña), é uma “fluta de pã” tradicional andina. Este instrumento é o principal instrumento usado em um gênero musical conhecido como o Sikuri. É tradicionalmente encontrados em todo o Andes, mas é mais tipicamente associadas com a música do Kollasuyo , ou Aymara regiões falando em torno do lago Titicaca . (Fonte: Wikipédia)