Por Luiz Fernando Veríssimo
Existem muitas histórias sobre o analista de Bagé mas não sei se todas são verdadeiras. Seus métodos são certamente pouco ortodoxos, embora ele mesmo se descreva como "freudiano barbaridade". E parece que dão certo, pois sua clientela aumenta. Foi ele que desenvolveu a terapia do joelhaço.
Diz que quando recebe um paciente novo no seu consultório a primeira coisa que o analista de Bagé faz é lhe dar um joelhaço. Em paciente homem, claro, pois em mulher, segundo ele, "só se bate pra descarregá energia". Depois do joelhaço o paciente é levado, dobrado ao meio, para o divã coberto com um pelego.
- Te abanca, índio velho, que tá incluído no preço.
- Ai - diz o paciente.
- Toma um mate?
- Na-não... - geme o paciente.
- Respira fundo, tchê. Enche o bucho que passa.
O paciente respira fundo. O analista de Bagé pergunta:
- Agora, qual é o causo?
- É depressão, doutor.
O analista de Bagé tira uma palha de trás da orelha e começa a enrolar um cigarro.
- Tô te ouvindo - diz.
- É uma coisa existencial, entende?
- Continua, no más.
- Começo a pensar, assim, na finitude humana em contraste com o infinito cósmico...
- Mas tu é mais complicado que receita de creme Assis Brasil.
- E então tenho consciência do vazio da existência, da desesperança inerente à condição humana. E isso me angustia.
- Pois vamos dar um jeito nisso agorita - diz o analista de Bagé, com uma baforada.
- O senhor vai curar a minha angústia?
- Não, vou mudar o mundo. Cortar o mal pela mandioca.
- Mudar o mundo?
- Dou uns telefonemas aí e mudo a condição humana.
- Mas... Isso é impossível!
- Ainda bem que tu reconhece, animal!
- Entendi. O senhor quer dizer que é bobagem se angustiar com o inevitável.
- Bobagem é espirrá na farofa. Isso é burrice e da gorda.
- Mas acontece que eu me angustio. Me dá um aperto na garganta...
- Escuta aqui, tchê. Tu te alimenta bem?
- Me alimento.
- Tem casa com galpão?
- Bem... Apartamento.
- Não é veado?
- Não.
- Tá com os carnê em dia?
- Estou.
- Então, ó bagual. Te preocupa com a defesa do Guarani e larga o infinito.
- O Freud não me diria isso.
- O que o Freud diria tu não ia entender mesmo. Ou tu sabe alemão?
- Não.
- Então te fecha. E olha os pés no meu pelego.
- Só sei que estou deprimido e isso é terrível. É pior do que tudo.
Aí o analista de Bagé chega a sua cadeira para perto do divã e pergunta:
- É pior que joelhaço?
Retirado de: http://literal.terra.com.br/verissimo/biobiblio/ostipos/analista/analista_cronica.shtml?biobiblio2
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Guardadas as devidas proporções, essa história de humor (que me perdoem os críticos e puristas em geral) tem muitas semelhanças com um Koan Zen-Budista atribuído a Bodhidharma (o monge budista que introduziu o Zen na China vindo da Índia no início do século V) e seu discípulo Hui-Ko:
"Hui-ko procurou Bodhidharma, primeiro patriarca do zen chinês e lhe disse:
- Mestre, não tenho paz na minha mente. Pacifica minha mente.
- Traz tua mente à minha presença e eu a pacifico.
- Mas, mestre, quando busco minha própria mente, não consigo encontrá-la, diz Hui-ko.
E Bodhidharma então respondeu:
- Pronto! Então já pacifiquei tua mente."
Adoro, no más!!!
ResponderExcluir"mais complicado que receita de creme Assis Brasil..."
kkkkkkkkkkkkkkkkk
Bjs