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sábado, 9 de abril de 2011

Pequeno Guia de Bares e Restaurantes

Por Luiz Fernando Veríssimo
CABEÇA — Bar da pesada. O leão-de-chácara pega quem estiver fazendo algazarra na calçada e atira para dentro. Tão escuro que as pessoas só se reconhecem pelo tato, o que dá muita briga. Todas as noites, a uma, há um show. Uma mulher completamente vestida senta numa cadeira no palco e fica olhando enquanto os frequentadores tiram a roupa. O movimento nos banheiros é tão grande que precisa ter hora marcada. Não há queixas do uísque, que é paraguaio legítimo, Royal Acidity.

DRAGÃO DA BAVÁRIA — Restaurante chinês e alemão. Sauerbratten Mit Brotos de Bambu. Salsichão acre-doce. Atendido por duas japonesas vestidas a caráter (tirolês) e um alemão, envergonhado, de quimono.

PU’S — Restaurante japonês. Comida igual a que você encontra em Tóquio atualmente. Hamburguers, hot dog, sundaes. As garçonetes são treinadas desde pequenas para não confundir a mostarda com o ketchup.

INTIME — Bar de encontro. Decoração sugestiva: fronhas, lençóis. Todas as mesas são de cabeceira. Tem um pianista, um contrabaixista e um baterista, mas não tem piano, contrabaixo e bateria. Os três ficam a noite toda encostados no bar falando mal da gerência.

PELANCÃO — Restaurante popular. Tem convênio com o INAMPS. A canja de galinha vem com um bilhete da galinha dentro dizendo que, infelizmente, não pode comparecer, mas está pensando em você. O único restaurante da cidade onde o Virado à Paulista se vira sozinho.

APOSTROFE’S — fiar de embalo. Todos se conhecem e quando alguém entra em levitação ninguém mais grita "milagre!". Preste atenção na fumaça que sai da cozinha. Fumaça branca é a escolha de um novo papa ou maconha, provavelmente a segunda. Fumaça cinza é bife. Fumaça preta é incêndio. Neste caso todos correm para pegar o extintor, fugir com ele e tentar vender.

LE QUELQUE CHOSE - Cozinha francesa. O maitre é do Ceará e diz "Cannard ao Tour D'Arxente". Tudo é flambado na mesa, inclusive as azeitonas do couvert. Mas, desgraçadamente, não a conta.

MAMATA — Restaurante italiano. O importante é a atmosfera. Mas cuidado. Um dos presuntos já caiu do teto e matou um freguês. Os garçons cantam, contam piadas e ajudam a manter o ambiente descontraído e alegre, mas se revoltam se você pedir para que sirvam a mesa também.

GUAMPA 'S — Churrascaria típica. Música ao vivo todas as noites com músicos a caráter, inclusive Tomazito do Passo Fundo, que toca serra elétrica. O carrinho das saladas é puxado por um boi de verdade, o que, devido às poucas dimensões do lugar, causa algum transtorno. O próprio cliente escolhe a carne que vai comer e ela é descongelada na sua frente.

CHEGAY — Boate gay. Horários femininos das oito às dez e da meia-noite às duas, masculinos das dez à meia-noite e da duas as quatro, mas há muito intercâmbio. No horário feminino é muito comentada a história de certa jovem que saiu correndo ao soar da meia-noite e deixou cair sua botina na escadaria.

VUPT-VUPT — Discoteca. Metade dos frequentadores vai só para olhar e a outra metade vai para olhar os que estão olhando. Na pista de dança fica tão apertado que beijo na nuca é flerte.

AO PEIXOTO — Especializado em coisas do mar. Óleo, mercúrio, dejetos. O namorado, quando chega a mesa, já noivou, casou e se desquitou.

FOSSA — Bar depressivo. Os garçons tomam nota do seu pedido e depois o interpretam à luz da teoria neofreudiana. O chope é choco, os sanduíches não têm gosto e, como se não bastasse isto, a Terra não passa de um cisco num universo sem sentido. Impressionados com o grande número de suicidas em potencial entre os frequentadores, a gerência do bar tomou uma decisão: ninguém mais pendura a conta.

ALALAL — Cozinha árabe. Mas o salão é judeu e o hall de entrada é palestino. Mantenha distância.

25 DE ABRIL — Restaurante português. Ex-Salazar. Os pratos mudaram de nome — o Bacalhau a Américo Tomaz agora é Bacalhau a Eanes, por exemplo — mas continuam bons. As Iscas de Fígado a Mário Soares estão temporariamente em falta. Não servem o vinho Ferreirinha até descobrirem a posição política do homem.

GIRIMUN’S — Comida do Norte e do Nordeste. O camarão pode ser à baiana, a meia-baiana ou pra covarde, e neste caso aparece toda a equipe da cozinha e vaia quem pediu.

GISCARD'S — Ambiente requintado. Cada mesa tem dois garçons para servir a comida, um para a bebida e um para tirar o seu sapato e coçar o seu pé, mesmo que você não queira. O chef se chama Ernestina e sai na Mangueira, mas isto é segredo. Quando trouxerem o caviar não se contente apenas em saber que é do mar Cáspio. Pergunte: "De que margem?" O maitre beijará você ou atirará o gelo na sua cabeça, mas valerá a pena.

Publicado na revista Domingo do Jornal do Brasil, número 133 de 05/11/1978.

Um comentário:

  1. Depois disso, chego a sentir saudade do "Bar & Restaurante Recanto dos Casais de Cordovil", internacionalmente conhecido como "Pisa na Barata".

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