Entrevista com a Dra. Olga Inês Tessari
Quando as emoções provocam doenças
“Toda enfermidade é intencional”.
Com esta frase, o psicanalista Sigmund Freud quis dizer que, de uma forma ou de outra, as pessoas adquirem ganhos secundários quando manifestam alguma doença. Principalmente quando a usam para chamar a atenção ou como forma de exteriorizar dificuldades emocionais. Este é o caso das doenças psicossomáticas – ou seja, de fundo emocional -, que atingem um terço da população mundial. Elas aparecem em qualquer pessoa, em qualquer idade, e podem prejudicar os relacionamentos, a vida pessoal e a rotina. Saiba como identificá-las e o que é preciso fazer para se livrar dos sintomas.
O que é
Doenças psicossomáticas (a palavra somatos, em grego, significa corpo) são manifestações orgânicas que podem ser provocadas ou cujos sintomas podem ser agravados por problemas mentais ou emocionais. É um processo pelo qual a pessoa “transfere” para o organismo a carga emocional decorrente de algum problema que está vivendo. A consequência, muitas vezes, é o surgimento de uma doença ou o agravamento de uma já existente. Em outras palavras, é quando a pessoa, por não saber expressar suas emoções e externalizar seus conflitos de forma adequada, acaba por armazenar suas tensões em seu corpo.
Isso desencadeia processos no organismo, gerando o estresse que, em longo prazo, provoca o aparecimento de doenças. “Todos nós já percebemos que, quando passamos por momentos importantes de tristeza, ansiedade, raiva e problemas afetivos, nosso organismo reage. Conflitos que não encontram espaço para serem resolvidos na mente são transferidos para o corpo”, comenta a psicóloga e psicoterapeuta Olga Inês Tessari.
Carência ou doença real?
As doenças psicossomáticas surgem em momentos de muita ansiedade, estresse e frustração. E são bastante comum em pessoas “implosivas”, que não costumam extravasar os sentimentos, guardando para si sentimentos como dor e mágoa. Assim, a tensão causada por eles se acumula no organismo e, uma hora, “explode”, causando manifestações do organismo. E aí, aparecem doenças como síndrome do pânico, gastrite nervosa, asma, úlcera, artrite e problemas dermatológicos ou sexuais.
Qualquer pessoa pode somatizar, mas existem aquelas que podem ser consideradas “somatizadoras típicas”, que sofrem com o problema com bastante frequência e estão constantemente procurando algum tratamento médico. Estudiosos do tema chegaram à conclusão de que essas pessoas costumam ser carentes e que os sintomas seriam uma forma de chamar a atenção. Crianças são um bom exemplo disso: quando não têm seus desejos atendidos, algumas delas têm febre para ganhar a atenção da mãe. Assim, a mãe para tudo para dispensar cuidados especiais. E é bastante comum que a garotada exteriorize suas dificuldades emocionais manifestando crises de asma, vômito, cólica ou ainda fazendo xixi na cama. Mas são os adolescentes e adultos que costumam sofrer mais com a somatização.
Causas
Os sintomas, em geral, iniciam-se antes dos trinta anos de idade e ocorrem mais frequentemente em mulheres, interferindo na vida pessoal, levando à necessidade de um tratamento médico. A causa ainda não foi descoberta, mas os sintomas costumam surgir em momentos definidos como, por exemplo, no começo da idade escolar, durante a crise da adolescência ou no início da vida adulta, em função de responsabilidades profissionais e sociais. São, ainda, resultado de perdas significativas, tais como a morte de um parente ou a perda do emprego. Também podem surgir com a crise da meia-idade.
Mas por que as doenças psicossomáticas acontecem? Porque certas condições orgânicas estão ligadas a determinados estados emocionais. Se algo não vai bem com o indivíduo, o organismo “sente”, e o sistema nervoso central manda várias substâncias para a corrente sanguínea, como neurotransmissores e hormônios – que atuam como reguladores do organismo. Assim, basta que se esteja em desequilíbrio para as doenças começarem a aparecer.
O papel das emoções
Segundo Olga Tessari, quem sofre com a somatização são as pessoas que têm dificuldade de expressar suas emoções de forma adequada ou que as reprimem. “São frequentes os casos em que a doença dura a vida inteira. As pessoas com esse distúrbio costumam se relacionar com outras pessoas através dos seus sintomas”, diz a psicóloga. Doentes psicossomáticos têm muita dificuldade em admitir que têm um problema de fundo emocional, justamente por conta dos sintomas físicos que o acompanham. “Seu raciocínio os faz pensar que, se têm sintomas físicos, certamente é uma doença, e não um problema de fundo emocional. Isso os leva a ter uma resistência muito grande para procurar tratamento psicológico, mesmo com a insistência dos médicos que os acompanham”, sublinha a Dra. Olga Tessari. Mesmo quando vão ao psicólogo, esses pacientes o fazem de má-vontade e não conseguem falar de sua vida íntima ou de seus sentimentos, o que leva ao abandono do tratamento.
Como tratar
Para descobrir se a doença é mesmo psicossomática, o médico deve fazer um exame físico detalhado, solicitando também exames laboratoriais, para excluir causas físicas dos sintomas, que costumam ser vagos e indefinidos. Vale dizer que existe a possibilidade de que uma doença real possa passar despercebida pelo médico em pessoas com um distúrbio de somatização por história pregressa de queixas infundadas. Por isso, a atenção durante o diagnóstico deve ser redobrada.
Nos casos de somatização, o objetivo do tratamento é auxiliar o indivíduo a aprender a lidar com os sintomas físicos e entender que eles têm uma origem psíquica. É preciso, principalmente, manter uma relação de empatia e confiança com o médico, comparecendo regularmente às consultas para avaliar os sintomas. O médico, por sua vez, deve explicar ao paciente os resultados dos exames e esclarecer quais os mecanismos que a pessoa utiliza para enfrentar os seus problemas. Mas é preciso muito tato para manter essa boa relação. “Não se deve dizer a uma pessoa que seus sintomas são imaginários. Uma relação ruim com o médico pode agravar o problema”, ressalta Olga Tessari. A psicóloga comenta que, se não houver tratamento psicológico e mudanças na vida do paciente, a somatização pode se arrastar pela vida inteira. Um grande passo é aprender a lidar de forma positiva com emoções e conflitos, que são os fatores que geram as doenças psicossomáticas.
Apoio é fundamental
O apoio de familiares e amigos é muito importante para a auto-estima de um doente psicossomático. Em primeiro lugar, é preciso entender que a pessoa sofre muito com os sintomas físicos. A família, segundo a psicóloga, jamais deve questionar ou dizer que seus sintomas são fruto da imaginação, pois isso pode gerar ainda mais sofrimento. “Acompanhá-la nas consultas médicas, sempre que possível, de forma que possam ter subsídios para convencer a pessoa a buscar tratamento psicológico, pode ajudar a vencer os obstáculos”, recomenda a Dra. Olga Tessari.
Publicado na Revista Ciclo (São Rafael Previdência) em agosto/2007
Dra. Olga Inês Tessari: Autora do livro "Dirija a sua vida sem medo"
Escritora - Palestrante - Pesquisadora – Consultora - Psicóloga e Psicoterapeuta desde 1984.
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