Por Camila Guimarães, Luiza Karam e Isabella Ayub,
na Época
Os
alunos do 3º ano de uma das melhores escolas de ensino médio dos Estados
Unidos, a Wellesley High School, em Massachusetts, estavam reunidos, numa tarde
ensolarada no mês passado, para o momento mais especial de sua vida escolar, a
formatura. Com seus chapéus e becas coloridos e pais orgulhosos na plateia,
todos se preparavam para ouvir o discurso do professor de inglês David
McCullough Jr. Esperavam, como sempre nessas ocasiões, uma ode a seus feitos
acadêmicos, esportivos e sociais. O que ouviram do professor, porém, pode ser
resumido em quatro palavras: vocês não são especiais. Elas foram repetidas nove
vezes em 13 minutos. “Ao contrário do que seus troféus de futebol e seus
boletins sugerem, vocês não são especiais”, disse McCullough logo no começo. “Adultos
ocupados mimam vocês, os beijam, os confortam, os ensinam, os treinam, os
ouvem, os aconselham, os encorajam, os consolam e os encorajam de novo. (…)
Assistimos a todos os seus jogos, seus recitais, suas feiras de ciências.
Sorrimos quando vocês entram na sala e nos deliciamos a cada tweet seus. Mas
não tenham a ideia errada de que vocês são especiais. Porque vocês não são.”
O
que aconteceu nos dias seguintes deixou McCullough atônito. Ao chegar para
trabalhar na segunda-feira, notou que havia o dobro da quantidade de e-mails
que costumava receber em sua caixa postal. Paravam na rua para cumprimentá-lo.
Seu telefone não parava de tocar. Dezenas de repórteres de jornais, revistas,
TV e rádio queriam entrevistá-lo. Todos queriam saber mais sobre o professor
que teve a coragem de esclarecer que seus alunos não eram o centro do universo.
Sem querer, ele tocara num tema que a sociedade estava louca para discutir –
mas não tinha coragem. Menos de uma semana depois, McCullough fez a primeira
aparição na TV. Teve de explicar que não menosprezava seus jovens alunos, mas
julgava necessário alertá-los. “Em 26 anos ensinando adolescentes, pude ver
como eles crescem cercados por adultos que os tratam como preciosidades”, disse
ele a ÉPOCA. “Mas, para se dar bem daqui para a frente, eles precisam saber que
agora estão todos na mesma linha, que nenhum é mais importante que o outro.”
A
reação ao discurso do professor McCullough pode parecer apenas mais um desses
fenômenos de histeria americanos. Mas a verdade é que ele tocou numa questão
que incomoda pais, educadores e empresas no mundo inteiro – a existência de
adolescentes e jovens adultos que têm uma percepção totalmente irrealista de si
mesmos e de seus talentos. Esses jovens cresceram ouvindo de seus pais e professores
que tudo o que faziam era especial e desenvolveram uma autoestima tão exagerada
que não conseguem lidar com as frustrações do mundo real. “Muitos pais modernos
expressam amor por seus filhos tratando-os como se eles fossem da realeza”,
afirma Keith Campbell, psicólogo da Universidade da Geórgia e coautor do livro
Narcisism epidemic (Epidemia narcisista), de 2009, sem tradução para o
português. “Eles precisam entender que seus filhos são especiais para eles, não
para o resto do mundo.”
Em
português, inglês ou chinês, esses filhos incensados desde o berço formam a
turma do “eu me acho”. Porque se acham mesmo. Eles se acham os melhores alunos
(se tiram uma nota ruim, é o professor que não os entende). Eles se acham os
mais competentes no trabalho (se recebem críticas, é porque o chefe tem inveja
do frescor de seu talento). Eles se acham merecedores de constantes elogios e
rápido reconhecimento (se não são promovidos em pouco tempo, a empresa foi
injusta em não reconhecer seu valor). Você conhece alguém assim em seu trabalho
ou em sua turma de amigos? Boa parte deles, no Brasil e no resto do mundo, foi
bem-educada, teve acesso aos melhores colégios, fala outras línguas e, claro, é
ligada em tecnologia e competente em seu uso. São bons, é fato. Mas se acham
mais do que ótimos.
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