CAPÍTULO 04
É manhã de segunda-feira e Charles Disco está em Copacabana numa das ruas transversais que dão acesso a avenida Atlântica e cruza a rua, indo na direção das escadas de mármore da delegacia 54. O prédio é antigo e foi reformado na década de 90 para abrigar a Delegacia Central onde estava o Departamento Antissequestros da zona sul. Tem estilo misto e mastros com bandeiras da cidade e do estado exatamente sobre as duas colunas que ladeiam a entrada.
Aquela hora, a sala do delegado-chefe Cláudio Vicente Matias estava calma. Tudo naquele dia estava normal. Era uma sala ampla com uma mesa escura no centro, cujo tampo luzidio refletia as lâmpadas fluorescentes do teto. Sobre ela, três telefones, um vermelho e dois beges, um porta retrato duplo com fotos de família e a plaqueta triangular com seu nome escrito em bronze sobre ébano.
Matias era um homem grande, moreno, de cabeça quadrada e cabelo crespo, com um fino e bem tratado bigode. Estava sentado a mesa, segurando uma caneca de café com ambas as mãos, realçando o ventre gordo ao qual faltavam alguns exercícios.
Alguém bate na porta.
- Pode entrar! - Ordena ele.
O delegado Fecha a cara quando reconhece a visita.
- O que quer aqui?
Disco nunca deixava de se impressionar com a mania de limpeza de Matias. Havia um arquivo metálico à direita e um pequeno armário preto à esquerda, onde mantinha seus processos, sobre ele, uma cafeteira elétrica e alguns copos. A porta do banheiro ficava também à direita.
- Vim conversar com você.
- Acho que não temos nada para conversar. - Diz secamente.
- Sabe, Matias... Eu adoro vir aqui. Esse seu escritório parece saído de um comercial de produtos de limpeza.
- É delegado Matias, senhor Disco. Diga logo o que o trouxe aqui. Não tenho tempo a perder com você.
- Não imagina? - Pergunta ironicamente - Quero informações sobre o rapto de Anna Carla Monte Verde.
- Então aceitou o caso?
- Sim. E obrigado por me indicar.
- Bah! - Desdenha ele - Só queria me ver livre daquela gente chata. Ficavam o tempo todo no meu pé.
- A coisa está tão feia assim?
- Estamos fazendo o melhor que podemos. Não precisamos de ninguém para nos encher o saco. E isso vale para você também!
- Não se altere, Matias. Que tal me contar o que já descobriu?
- Quer dizer que o grande detetive agora recorre aos profissionais?
- Eu não sou detetive, Matias!
- Muito bem, “grande aventureiro”, vou dizer-lhe o que sabemos, até porquê não é segredo para ninguém: A menina foi raptada por um bando muito bem treinado, que sabiam exatamente como agir e quem levar. Interrogamos todos na casa e não descobrimos nenhuma pista. Só o que sabemos é que esse não foi o seu primeiro ataque.
- Como assim?
- Há exatos seis meses antes do seqüestro da garota, um grupo que corresponde a mesma descrição desses, atacou a cobertura de Eleonora Kiriaki no décimo quinto andar de seu prédio no Grajaú em pleno dia e a levaram junto com a maioria dos objetos de valor sem que ninguém notasse nada de anormal.
- Qual a idade dessa Eleonora?
- Sessenta e cinco anos.
-. Tinha alguma ligação com a família Monte Verde?
- Nós checamos isso. Freqüentavam as mesmas festas e encontros sociais, nada mais, como uma centena de socialites da cidade. Nenhum padrão aparente já que no caso da menina dos Monte Verde nada foi levado.
- Ambas são mulheres, ricas e raptadas num espaço de seis meses sem resgate. Isso me parece um padrão.
- Que quer dizer o quê?
- Me faz pensar porque não teriam feito contato... Será que não terminaram seu trabalho e voltaram a atacar de novo por esses dias?
- Ataques de seis em seis meses? - Debocha o Delegado.
- Daria tempo para estudarem uma outra possível vítima.
- É óbvio demais.
- Os árabes tem um ditado muito interessante... Ele diz que se uma coisa acontece da mesma forma duas vezes, com toda certeza acontecerá uma terceira. Às vezes, meu caro Matias, é nas coisas óbvias que se escondem as respostas para os maiores enigmas. - Fala Disco saindo da sala.
- É Delegado Matias, Sherlock de araque! - Esbraveja enquanto a porta se fecha atrás de Disco.
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