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sábado, 18 de fevereiro de 2012

Shinto: O Caminho dos Kami

Por Aoi Kuwan

O Shinto, literalmente traduzido como “o Caminho dos Kami”, é uma religião étnica e natural surgida no Japão com o objetivo de cultuar os Kami, entidades sobrenaturais erroneamente denominadas “deuses”.

Já comentei várias vezes sobre a tradução errada dos Cinco “Elementos” Chineses, que não são elementos, mas movimentos, e que eles não possuem equivalência com os Quatro Elementos Ocidentais. [leia sobre isso aqui] Outra tradução errada que insistem é com a palavra Kami.  

A melhor tradução para Kami é a palavra “espírito”, mas isso é uma simplificação de um conceito complexo – o Kami pode ser um elemento da paisagem ou uma força da natureza.

Os Kami estão perto de seres humanos e respondem às suas orações. Eles podem influenciar o curso das forças naturais e os acontecimentos humanos. A crença xintoísta possui diversos conceitos do que seja Kami. Embora estes conceitos estejam intimamente relacionados, eles não são totalmente equivalentes.

Kami pode se referir a um tipo de entidade específica, ou a uma qualidade que outros seres podem desenvolver, isto é, a características particulares a tipo de entidade específica, mas que são encontradas em outros tipos de seres.

Nesse ponto, convém lembrar que a palavra Kami, palavra japonesa, é escrita com o mesmo kanji usado para escrever Shen, palavra chinesa que possui, obviamente, o mesmo significado (espírito), e é usada para designar um dos Três Tesouros da Vida do Tao. [Leia sobre isso aqui] Assim, todas as criaturas possuem kami, mas somente aquelas que desenvolvem e demonstram a sua natureza kami de modo destacado é que podem ser referidas como kami.

No entanto, nem todos os Kami são bons. Existem kamis maus, os quais são chamados de Majin. Aqui, adentramos a um ponto nebuloso do conceito de Kami: Kami não é Deus.

Os problemas começaram no início do século XIX, quando iniciaram as traduções da Bíblia para o japonês. Na falta de uma expressão melhor na língua japonesa para expressar o conceito cristão de Deus, os tradutores escolheram a palavra Kami.

Isso causou uma grande confusão até mesmo entre os próprios japoneses: o teólogo xintoísta Kenji Ueda, em 1900, estimou que 65% dos estudantes ingressantes na faculdade de teologia associavam o termo Kami com alguma versão do conceito ocidental de um ser supremo. Se em um século uma tradução mal elaborada da Bíblia Cristã para o japonês causou esse tipo de problema entre os japoneses, o que dirá traduções do hebraico e do grego para outras línguas indo-européias em mais de 2.000 anos?

Os Kamis, como entidades específicas, são frequentemente descritos como seres divinos ou deuses, mas os Kamis não são parecidos com os deuses de outras religiões monoteístas: eles não são onipotentes e não são perfeitos. Eles podem se apresentar como elementos da natureza, como paisagens, montanhas, lagos e oceanos; e como as forças da própria natureza, tais como tempestades e terremotos.

Além desses, os seres humanos que tiveram uma vida notável, repleta de realizações, que desenvolveram seu Shen e alcançaram certa evolução espiritual são chamados de Kami. Os espíritos dos antepassados, cultuados e tratados como protetores da egrégora familiar, também adquirem o “status” de Kami.

A explicação do conceito de Kami está longe de ser esgotada. Já diziam os xintoístas que os seres humanos são incapazes de formar um verdadeiro entendimento de sua natureza. Realmente, torna-se complicado materializar em palavras os conceitos imateriais, e mais complicado ainda traduzi-los de um idioma para o outro e de uma cultura para a outra.

A origem do Shinto é muito discutida pelos estudiosos orientais. Esteja o seu ponto de origem junto com a formação da cultura japonesa, ou com a influência da filosofia chinesa e do budismo mayahana, o fato é que o Shinto foi moldado à luz de várias religiões estrangeiras. Em geral, é amplamente considerado que o Shinto surgiu como religião a partir de outras formas religiosas tais como o animismo, o shamanismo, o culto aos ancestrais e o culto à natureza, gradualmente moldando seus próprios rituais e formas de culto.

A adoração aos Kami, visto como o centro do Shinto, mudou bastante com o passar dos anos. A influência budista trouxe o “amálgama de kami e budas”, o chamado Shuugou Shinbutsu, acarretando mudanças na filosofia e nas práticas diárias e de culto nos santuários. Após o período Kamamura (1333 A.D.), surgiram várias teorias xintoístas com base das ideias de Confúcio.

O mais importante impacto religioso e filosófico sobre a estrutura do Shinto foi representado pelo budismo, mas o antigo pensamento chinês e o confucionismo possuem também uma grande influência. A inspiração chinesa deu-se basicamente através do Onmyoudou, que influenciou os rituais de purificação. O próprio Shugendou é um produto do nascente Shuugou Shinbutsu, mas que, após sua consolidação, exerceu sua influência na formação do xintoísmo moderno.

Até um pouco antes do início da Segunda Guerra Mundial, os santuários e templos xintoístas possuíam uma certa autonomia, o que favoreceu o surgimento de diversas “novas religiões” derivadas do Shinto. Depois da guerra, o sistema de santuário foi consolidado sob o Jinja Honchou (algo como uma associação de santuários xintoístas), permanecendo até os dias de hoje.

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Aoi Kuwan é autora do blog Magia Oriental, dedicado à divulgação das tradições e sistemas de magias orientais, especialmente aqueles ligados ao Japão.

Texto retirado e adaptado de:

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