Por Luisão CS
Algumas pessoas esclarecidas creem em coisas raras porque estão treinadas para defender crenças às quais chegaram por razões pouco inteligentes. Mas o seguinte experimento que vou referir trata mais de pessoas normais que professam algum tipo de fé e que não estão especialmente prontas para defendê-la. Então preferem não escutar. Simplesmente não escutam para impedir a entrada em sua mente de pontos de vista que lhes seriam inconvenientes. Algo parecido à reação infantil:
- "Nãnãninãnãná, não estou escutando nada... nãnãninãnãná..."
A experiência foi realizada na década de 60 pelos cientistas cognitivos Timothy Brock e Joe Balloun. A metade dos participantes no experimento eram religiosos, e a outra metade, ateus. Ambos os grupos ouviram uma mensagem gravada que atacava o cristianismo.
Mas tinha algo mais. Na gravação acrescentaram um pouco da chata eletricidade estática, uma espécie de ruído branco de fundo que impedia entender bem todas as palavras. Não obstante, quem escutava a mensagem tinha a possibilidade de reduzir estas interferências apertando um botão: então a mensagem podia ser entendida sem dificuldade.
Os resultados foram totalmente previsíveis e bastante deprimentes: os não crentes sempre tentavam eliminar as interferências, enquanto os religiosos preferiam que a mensagem permanecesse difícil de ouvir. Em posteriores experiências de Brock e Balloun em que fumantes escutavam um discurso sobre a relação entre o fumo e o câncer, revelou-se um efeito parecido. Todos calamos a dissonância cognitiva mediante a ignorância auto-imposta.
Naturalmente, isto ocorre em todo tipo de pessoas: também entre cientistas ateus em frente a argumentos de crentes. Ainda que, neste caso, o fato não é tão flagrante porque os cientistas costumam alegar provas (ou se limitam a negar que não creem, e o ônus da prova está em quem afirma, não em quem nega). E raramente veremos que um cientista se sinta ofendido em suas crenças se por acaso um crente criticar suas ideias científicas: só é bom cientista precisamente aquele que almeja encontrar erros em suas ideias a fim de evidenciar ideia melhores. No caso do crente, inclusive aplaudem a imobilidade das ideias ainda que tudo aponte a que estão equivocados.
Por isso, muitos crentes se negam a escutar os argumentos esgrimidos por ateus, ou pela própria ciência, se estes entram em conflito com suas crenças. E se escutam-nos, é como se só ouvissem o som das palavras, mas a mensagem não lhes frutifica à mente.
Algo parecido acontece em um artigo de ciência onde se critique ou questione a fé: em seguida teremos uma profusão de leitores que tratarão de defender com unhas e dentes suas crenças (no melhor dos casos) ou censurar o conteúdo de qualquer forma, por exemplo, alegando que o conteúdo lhes ofende profundamente (no pior). Nesse sentido, resulta curioso essa coisa de ter que respeitar as crenças alheias: se todas se respeitassem, também deveriam se respeitar o "não respeitar" determinadas crenças. Ou inclusive deveríamos respeitar ideias como o nazismo, a escravidão ou a pederastia. As ideias nunca merecem respeito, senão as pessoas; e as pessoas não deveriam ser suas ideias, senão dificilmente progrediriam e aprenderiam com seus próprios erros.
Dito dessa forma, talvez devêssemos respeitar um único mandamento, o undécimo: aprenderás, duvidarás de tudo, sobretudo de quem se diz dono da verdade, e também duvidarás de ti mesmo e do resto dos 10 Mandamentos. E se alguém disser que aquilo que crês é falso ou é perigoso, desejarás com toda tua força e alma que expliquem a razão, para não desperdiçar nem um minuto mais naquilo.
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