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segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Diálogo sobre o EU Verdadeiro

− Mestre, os Yogues dizem que para encontrar a Verdade é necessário renunciar ao mundo e retirar-se para as profundezas da selva ou para as cavernas da montanha. No Ocidente isso é uma coisa praticamente impossível, de tal modo nossa existência é diferente. Qual a sua opinião nesse sentido, Mestre?

− Não é absolutamente indispensável renunciar à vida ativa. Faça uma hora ou duas de meditação por dia, continuando seus afazeres. Precisa saber meditar. Quando se faz meditação perfeita, cria-se uma corrente espiritual cujos benefícios o senhor poderá sentir até no seu labor cotidiano. Isso será, em outras palavras, como duas maneiras de expressão de uma única idéia: sua atividade prosseguirá paralela à sua meditação.

− E qual será o resultado?


− O senhor verá, por experiência própria, que sua atitude para com as coisas e os seres, e até para com os acontecimentos, modificar-se-á aos poucos.

− Mestre, o senhor então não concorda com os Yogues, pelo menos nesse ponto!

− É o egoísmo pessoal que põe o homem prisioneiro deste mundo. Que ele procure libertar-se! A verdadeira renúncia está no abandono voluntário do nosso ego ilusório e enganador.

− Mas, Mestre! Como despojar-se de todo egoísmo e viver no mundo?

− Não há conflito essencial entre a vida ativa e a sabedoria.

− O senhor quer dizer que se pode continuar a exercer uma profissão, por exemplo, e alcançar a Sabedoria?

− E por quê não? Mas, neste caso, não será mais a mesma personalidade do homem que prossegue sua vida ativa, porque a consciência vai se transformando aos poucos, até chegar ao foco espiritual que está além da pequenez do eu.

− Mas quando se tem uma vida ativa, pouco tempo nos sobra para a meditação necessária.

− Reservar algum tempo para a meditação pertence apenas aos principiantes na vida espiritual. O homem avançado começará a gozar a beatitude mais profunda, esteja em atividade ou não: enquanto suas mãos estão atarefadas no trabalho, sua mente paira nas solidões infinitas.

− Como devo compreender, Mestre? Como, então, se deve fazer?

− Fazendo a pergunta a si mesmo: quem sou? − Essa busca o levará, finalmente, a descobrir, em seu mais íntimo, algo que se oculta além da mente. Quando o senhor resolver este problema maior, todos os outros estarão resolvidos e não haverá mais dúvidas… Vou tentar fazer-me compreender melhor e ser mais claro: todos os seres vivem constantemente na busca da felicidade; de uma felicidade que eles pudessem pegar com as mãos e que jamais tivesse fim. Esse instinto é bom e natural. Entretanto, ao senhor nunca ocorreu a idéia de que acima de tudo, eles se amam a sí mesmos?

− E daí?

− Aproxime esse fato do outro: para chegar à felicidade, os homens agarrados a sí mesmos provam-na mediante todos os meios; uns escolhem a bebida, outros se entregam à religião. Relacionando esses fatos, o senhor pode ter a chave da verdadeira natureza do homem.

− Não… Eu não compreendo. Não sei bem aonde o Mestre quer chegar…

− A verdadeira natureza do homem é a felicidade! A felicidade é inata ao homem; a busca da felicidade é a busca inconsciente do Eu absoluto e interno. Portanto, o homem que consegue elevar-se por seu próprio esforço para alcançá-lo, atinge a felicidade que jamais perece.

− Mas, Mestre! Há tanta infelicidade no mundo…

− Certamente; mas isso acontece porque a ignorância veda ao homem a noção da sua verdadeira natureza; no entanto, todos os seres, sem exceção, conscientemente ou não, estão à sua procura.

− Mesmo os mais indignos, miseráveis, brutos e criminosos?

− Sim; somente se enganam quando julgam ter achado em suas falhas e fraquezas o segredo da felicidade. Essa ânsia é instintiva, mas, por ignorância, eles não sabem que, na realidade, é o seu verdadeiro Eu que buscam, e por isso procuram o caminho da felicidade na ignonímia e na baixeza. Seus próprios erros lhes serão fatais, porque a conduta do homem, irremediavelmente, recai sobre ele mesmo.

− O senhor que dizer, Mestre, que se tivermos o conhecimento do nosso verdadeiro Eu, conheceremos a felicidade sem limites?

O mestre, que não parecia se exprimir como filósofo nem como doutrinador, mas como um homem que fala com o coração; balança a cabeça, em sinal de “sim”.

− Que é exatamente esse eu do qual o Mestre falou? Se isso que o senhor diz for verdade, então é necessário que haja dois eus no homem?!

− Como poderia o homem estar na posse de dois eus? Para compreender melhor, precisa analisar-se a sí mesmo. O hábito de pensar como todo mundo pensa, faz com que o homem não se veja mais tal qual ele é de verdade; sua própria imagem não é mais exata. Por tempo demais ele se identifica com seu corpo e com seu cérebro. É por isso que lhe aconselho a buscar a solução da questão na pergunta: “quem sou eu?”… O senhor me pergunta pela verdadeira definição do eu. Como posso eu dá-la? É aquilo do qual nasce o sendo do “eu” pessoal e em que ele terá de desaparecer.

− Desaparecer? Perde-se, então, a noção da personalidade?

− O pensamento predominante no homem é o do eu − também é o primeiro sentido humano a aparecer no espírito. O eu vem sempre antes do tu. Seguindo o pensamento do eu, pela introspecção mental, descobre-se que, como foi o primeiro a aparecer, será o último a dissolver-se. Pode-se, aliás, fazer essa experiência por si mesmo.

− O Mestre acha então possível tal investigação no nosso íntimo e que possa ser facilmente praticada?

− Certamente; essa investigação pode nos levar até o ponto onde o ego gradualmente desaparece.

− Mas então, o que será de nós nesse momento? O homem ficará em estado de inconsciência ou se tornará idiota?

− De maneira alguma; dá-se precisamente o contrário. Ele vai atingir a vida consciente, a única que é imortal. Ao despertar da vida do seu verdadeiro Ser, que de fato é sua Real natureza, o homem tornar-se-á o Sábio.

− Mas, o senso do eu deve participar, evidentemente, dessa natureza?

− O senso do eu parte da pessoa; esse senso é ligado ao corpo e ao cérebro. Quando o homem, pela primeira vez, reconhece seu Eu real, uma força vem do seu íntimo e apodera-se dele; essa força é a inteligência transcendente; ela é incriada, infinita, divina e perene. Alguns a chamam o Reino do Céu, outros, Nirvana. os hindus a denominam Libertação. Pode-se-lhe dar o nome que se quiser − isso não influi. Quando essa força toma posse do homem, o homem então se perde realmente, ou melhor, ele se encontra.

Essa última frase faz o entrevistador pensar nas mesmas palavras proferidas pela boca do Galileu, muito embora permaneçam, ainda hoje, um enigma para muitos: “Aquele que procurar salvar sua vida, perde-la-á − e aquele que a perder, conservá-la-á.”. Ele acha a analogia surpreendente. − O mestre continua:

− Enquanto o homem não se tiver comprometido nessa busca, seguindo esse caminho, a dúvida e a incerteza sempre seguirão seus passos. Os grandes reis e os maiores estadistas lutam para governar os demais; no entanto, sabem muito bem no seu íntimo, que são incapazes de se dirigir a si mesmos; porque o verdadeiro poder pertence ao homem que penetrou no âmago mais fundo da sua alma! O cientista que passa a vida acumulando conhecimentos terá que baixar a cabeça quando lhe perguntarem se resolveu o mistério do homem e conquistou-se a si próprio! Ora, para que serve saber todas as coisas quando o senhor não sabe nada de si?! Que adianta conhecer o que se passa fora de nós, se ficamos na ignorância do que se passa dentro de nós? Evitamos pensar. No entanto, qual conhecimento é mais digno da nossa atenção e do nosso empenho?

− Talvez o empreendimento seja quase sobre-humano.

− É indispensável tentar; a dificuldade é menor do que se supõe.

− Para nós, ocidentais, ativos e práticos, essa introspecção desinteressada… − hesita, sem saber como terminar a frase.

− O conhecimento da Verdade, bem como a ação da mente são iguais para todos e representam as mesmas dificuldades, tanto para os hindus, como para os ocidentais. Admito que seja mais difícil para aquele que se debate nas amarras da vida agitada, mas num caso, como no outro, pode-se e deve-se alcançar o bom êxito. Trata-se aqui de criar uma corrente espiritual obtida pela prática da meditação constante, mantida pelo hábito diário. Pode-se então continuar seus afazeres sem que haja um choque entre a meditação e a atividade física. Quando o senhor for meditar sobre a pergunta: “QUEM SOU?”, começará a compreender que nem o corpo, nem a mente, nem os desejos dos sentidos são realmente o que o senhor considera ser o ego; basta só essa atitude para fazer surgir a resposta no recôndito do seu ser, aparecendo-lhe como uma profunda realização. Aprenda a conhecer-se a si mesmo e a Verdade brilhará em sua alma como um raio fulgente do sol; sua mente estará em paz e as ondas de felicidade o submergirão e o inebriarão, pois o Eu real e a felicidade são termos idênticos, e no momento em que conseguir a percepção direta do Ser, suas dúvidas se dissiparão, porque saberá tudo.

Retirado do livro A Índia Secreta de Paul Brunton.

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