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terça-feira, 12 de outubro de 2010

O Modo De Viver Taoista II

Por John Blofeld 
As necessidades de um taoista são poucas e simples. Seu alimento pode ser nutritivo e saboroso, sem a adição de ingredientes exóticos e extraordinariamente dispendiosos; suas roupas podem corresponder ao clima e serem atraentes, sem serem excessivamente numerosas ou confeccionadas com tecidos caros; pode-se muito bem viver com muito conforto sem peles ou joias caras, que, afinal, dão muito trabalho, pois precisam ser guardadas com muito cuidado; e também é possível arrumar um quarto ou morar de uma forma perfeitamente agradável sem fazer grandes gastos.

Em resumo, não há nenhuma vantagem — mas sérias e várias desvantagens - em possuir qualquer coisa em excesso e em adquirir e ir em busca de coisas caras e raras. Os adeptos do Caminho sabem, por instinto, como combinar o prazer de um conforto modesto e da beleza com um pouco de frugalidade; acima de tudo, eles fogem da ostentação.

Tenho que admitir que, embora o Taoismo ofereça um modo de viver admirável, não tem meios específicos de resolver o grande número de problemas que afligem nossas grandes cidades; esses problemas exigem soluções que estão além da capacidade de um indivíduo. Mesmo assim, como um lamaçal escuro torna-se um pouquinho menos opaco a cada gota de chuva pura ou de orvalho que ali caia, também a qualidade de densas comunidades urbanas pode melhorar a cada indivíduo que se torne livre de ganância, cobiça, extravagância, inveja e transações fraudulentas. Se no Ocidente os valores taoistas chegarem a ser apreciados por grande número de pessoas, especialmente se algumas dessas pessoas ocuparem postos de decisão, a sociedade como um todo, tanto quanto essas pessoas, será beneficiada.

A tolerância serena, bem-humorada, que caracteriza os seguidores do Caminho, torna-os avessos a interferências. Tranquilos no encalço de sei objetivos, felizes em partilhar sua sabedoria com todos os que deles s aproximam, por iniciativa própria, para pedir ajuda ou conselho, contentam-se em deixar os outros inteiramente livres para viverem as suas vidas com melhor lhes aprouver, para "seguirem o seu próprio caminho".

Os mestres s relutam em qualificar-se de missionários ou de pessoas indiscretas; de fato, têm uma tendência tão grande para evitar qualquer publicidade que seus vizinhos mais próximos podem ignorar totalmente que viver à pouca distância de um sábio. Sem dúvida, esta é uma das razões pela quais é tão difícil encontrá-los. Um chinês meu amigo, com considerável influência em círculos s e budistas, não foi capaz recentemente de persuadir alguns eruditos seguidores do Caminho, em Taiwan, a visitar América, onde numerosas pessoas se sentiriam honradas e encantadas em procurá-los.

Nas circunstâncias atuais, essa ausência total de espírito missionário é um tanto infeliz, mas os seguidores ocidentais do Caminho fariam melhor se escondessem a sua lâmpada em algum lugar; a impaciência em se considerado guru não condiz com uma atitude  de vida. Como disse Lao-tzü a respeito dos sábios do passado, "Eles eram reservados e hesitantes como se sentissem acanhados com as pessoas que os rodeavam, e tratavam todos com respeito, como se trata um convidado de honra". Até hoje não se encontra um verdadeiro sábio taoista que proclame "Eu sei tudo sobre o Tao. Se você quiser conquistar a meta, inscreva-se na minha escola".

Auto promoção é algo tão estranho ao espírito taoista que de fato é difícil encontrar-se um professor, mas isso é melhor do que ter uma grande quantidade de professores que se proclamem tais, mas que, pouco instruídos na matéria provavelmente irão desencaminhar discípulos  entusiasmados. Ademais, essa autopromoção serve de critério para julgar quais professores não devem ser procurados, isto é, quem quer que proclame em excesso o próprio avanço no Caminho.

Por outro lado, é diferente o caso de alguns bons professores que dão a conhecer a própria linhagem, pois esse tipo de informação geralmente pode ser verificada. Por linhagem entende-se o nome do professor do professor, o professor desse professor, e assim por diante, retrocedendo talvez por muitas gerações. Na China, descobrir a linhagem espiritual de um professor era um dos modos de averiguar se ele tinha algo de valioso a ensinar No Ocidente, com o correr do tempo, podem haver professores qualificados para ensinar iogas bem mais avançadas do que as contidas aqui; e um dos modos de identificá-los inicialmente será descobrir o nome dos professores que os instruíram.

A principal regra para a dieta dos adeptos do Taoismo (assim como de todo tipo de pessoas que se dedicam seriamente à meditação) é comer moderadamente. Aos adeptos ocidentais recomenda-se alimentarem-se com simplicidade e evitarem refeições pesadas, mas sem se oporem puritanamente a uma cozinha saborosa. Ascetismo rígido ou abusos, ambos significam um afastamento do Caminho, assim como a preocupação excessiva com o que comer e com o que não comer, pois a preocupação leva à ansiedade. Tão prejudicial à saúde física e mental como um veneno lento. O Taoísmo inculca uma atitude de desprendimento em relação a todas as coisas.

Os adeptos do Taoísmo, embora bebam vinho e bebidas alcoólicas com moderação, especialmente em tempo frio ou úmido, consideram a embriaguez, mesmo a ocasional, um afastamento do Caminho, uma vez que não é benéfica à saúde e de modo algum contribui para um progresso na meditação iogue. O tabaco é nocivo do ponto de vista iogue porque não contribui para um perfeito funcionamento do sistema respiratório.

Poucos taoistas fazem votos de castidade. Não ocorreria a um taoísta equiparar a relação sexual ao pecado, pois o sexo é uma função natural. Desejos reprimidos e fantasias angustiantes podem enfraquecer a saúde física e mental muito mais do que uma prática sexual cuidadosamente regulada, a qual é, portanto, considerada coerente com o cultivo do Caminho, principalmente durante os seus primeiros estágios. A ênfase está na moderação para evitar o dano que em algumas circunstâncias pode ser causado pela rígida castidade e, por outro lado; para inibir a frequência excessiva da emissão seminal, os taoistas advogam um regime de continência.
(Retirado e adaptado de: BLOFELD, John. O Portal da sabedoria: Iogas contemplativas e curativas, taoístas e budistas, adaptadas para os seguidores do Caminho no Ocidente. São Paulo : Editora Pensamento, 1984.)

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