Capítulo 05
Marcela
“Depois de sair da companhia de Domingos eu estava sozinho novamente. Mas dessa vez eu sabia me virar. Nos anos que se seguiram, consegui construir uma sólida reputação. A parte chata eram as constantes mudanças de endereço. Mas eu me acostumei. Então, a algum tempo atrás, inesperadamente como sempre, conheci alguém que mudaria minha vida.”
“Eu caminhava uma noite despreocupado pela rua de um bairro de subúrbio onde me instalara numa modesta pensão. Ao longe vi cinco rapazes vestidos como metaleiros cercando uma bonita moça branca de cabelos pretos encaracolados não muito longos (na altura dos ombros), ela vestia-se de forma sóbria e carregava, além da tradicional bolsa de mulher, cadernos e livros apertados junto ao corpo com os dois braços. Estavam sob um poste de luz na calçada próxima de desses ralos retangulares que fica rente ao meio-fio. Na minha profissão é sábio manter-se longe de encrencas, mas naquela noite não segui a regra, a moça era bonita e parecia ser de boa família, não o tipo de gente que anda com tipos malcheirosos como aqueles, então me aproximei.”
- Está acontecendo algum problema aqui?.
“O homem que parecia ser o líder, vestindo uma camisa de banda de Heavy Metal de mangas cortadas, cabelos louros curtos e calça jeans desbotada e tênis surrado virou-se para mim irritado.”
- Sai fora, mermão! Isso não é da tua conta. O papo aqui é entre eu e minha namorada. – Vira-se para a moça apavorada - Não é benzinho?
“A moça tinha os olhos arregalados de puro medo, como se o que o líder acabou de dizer fosse uma mentira (e era), mas ela não tinha coragem para contestar.”
- Olha, não entendo muito de namoros, mas não creio que esse seja um assunto para ser discutido em grupo. - Apontei para os companheiros do líder com sarcasmo e entrei no centro do círculo formado pelos homens para falar direto com a moça. - Não quer ficar aqui, não é?
“Ela não respondeu e eu estendi meu braço apontando para o espaço no círculo por onde eu havia entrado”
- Então, pode ir para casa.
“Ela saiu correndo dali agarrada com seus livros e cadernos.”
- Agora poderemos conversar melhor.
O líder sacou um canivete automático que abriu-se com um estalido metálico.
- Cara... Cê não sabe onde se meteu...
“Os quatro membros restantes do grupo também sacaram seus canivetes com estalidos metálicos. Não pude deixar de sorrir. Mesmo que eles soubessem usar aqueles brinquedinhos (e não sabiam) não eram páreo para mim.”
- Acho que vocês é que não sabem onde se meteram.
“Não estava a fim de perder tempo naquela noite com um bando de otários amadores, puxei minha pistola nove milímetros do coldre sob a axila e coloquei no rosto do líder da gangue.”
- Calma aí, cara... Cuidado com esse trabuco!
- Agora que já nos entendemos, joguem seus brinquedinhos aqui no ralo. E encostem-se aqui de costas para essa parede.
“Eles fizeram o que eu pedi e colocaram as mão na nuca.”
- Abaixem os braços! Não sou policial e não quero chamar a atenção. Eu não conheço aquela moça. Nem sei onde ela mora. Mas sei que deve ser por aqui. Assim como sei que vocês também devem morar por perto. – Coloquei o cano da arma encostada no nariz do líder - Acho bom que não aconteça nada com ela, porque se eu a vir com qualquer machucado ou com o pé enfaixado, nem vou perguntar se ela tropeçou. Vou atrás de vocês e pego um por um. Entenderam?
- Tudo bem, cara, tudo bem!
- Agora deem o fora daqui! Saiam da minha presença, antes que eu mude de ideia!
“Dias depois eu voltava caminhando pela calçada voltando para a pensão onde morava, um sobrado antigo com a entrada próxima à rua, com uma pequena calçada de menos de dois metros na frente e a moça da noite anterior estava de pé, encostada na parede ao lado da entrada.”
- Olá. Me disseram que morava aqui... Meu nome é Marcela. Gostaria de agradecer pelo que fez na outra noite.
- Não foi nada. Estava precisando de ajuda, não estava?
- Aqueles caras não me deixavam em paz. O que falou com eles? Agora parece que tem até medo de mim.
- Nada demais. São jovens desajustados. Precisavam apenas de uma palavra amiga de apoio e compreensão para verem o erro que estavam cometendo.
- Queria agradecer mais uma vez: Muito obrigado.
- Por nada. Foi um prazer ajudá-la. Os amigos me chamam de Renzo.
“Depois daquele dia, iniciamos uma amizade que logo se transformou em namoro. Não preciso nem dizer que foi a melhor fase da minha vida. Marcela era uma mulher muito especial. Percebi naquela ocasião uma oportunidade para mudar o rumo do meu destino. Ficamos noivos. Foi quando procurei o Nicolletti e peguei com ele um empréstimo para realizar meu sonho. Para ela, eu era um vendedor de computadores que viajava muito. Quando contei sobre meus planos, ela não cabia em si de felicidade. Com o dinheiro de Nicolletti, comprei e mobiliei nossa futura casa. Não era nada demais, uma casa de subúrbio comum, com varanda, telhado triangular e um quintal acima do nível da rua, com uma escadinha, portão metálico na calçada e muros com grades baixas. Iríamos casar no final daquele ano, mas...”
“Num dia de verão eu e Marcela caminhávamos pelo largo e movimentado corredor de um grande Shoping Center, com suas lojas, vitrines e muitas pessoas circulando. Faltavam três meses para o casamento. Estávamos em busca de coisas para nossa casa, quando percebi que estávamos sendo seguidos. Eu não os conhecia, mas eles com certeza sabiam quem eu era. Paramos diante de uma loja e os dois homens disfarçaram olhando a vitrine à sua frente, enquanto as pessoas passavam por eles.”
- Querida, vai andando e me espere na praça de alimentação que preciso ir ao banheiro.
“Como eu esperava os dois homens de terno escuro deixaram Marcela afastar-se e me seguiram. Um empurrou a porta do banheiro para entrar enquanto o outro olhava em volta. Lá dentro depois de passar pela porta de entrada havia outra semelhante imediatamente em frente: a porta do armário de vassouras e produtos de limpeza. À esquerda havia a continuação da parede e à direita, a passagem para o amplo salão onde ficavam os boxes com os vasos sanitários e os mictórios individuais separados por uma pequena parede. “
“Os dois homens empunharam suas pistolas com silenciadores na ponta do cano. Um deles, mais distante, segurava a pistola apontando-a para o chão. Enquanto o outro percorria os sanitários um a um, apontando a arma enquanto chutava as portas com o pé direito. Subitamente abri violentamente a porta do armário de vassouras e saltei sobre o primeiro homem colando meu corpo ao dele. Com a mão esquerda segurei seu pescoço e tapei sua boca, enquanto puxava-o para trás, sobrepondo a mão armada dele com a minha. Com apenas três disparos no peito eu arremessei o que estava mais distante para trás. Ainda com a mão direita sobre a do primeiro homem, dobrei o braço dele até apontar a pistola para a seu próprio corpo disparando mais três vezes.”
“Minutos depois eu já estava longe dali. Mas fiquei sabendo que um faxineiro idoso um pouco míope, de cabelos bancos lisos e curtos que já havia visto por ali, com uniforme cinza e boné, empurrava seu carrinho de limpeza com vassouras, esfregões e sacos de lixo e entrou pela mesma porta por onde eu e os dois homens entráramos. Ele empurrou seu carrinho em direção a área dos vasos sanitários assobiando uma canção e bateu na única porta fechada de um dos boxes centrais dos sanitários.”
- Moço! Vai demorar muito? Preciso limpar o banheiro.
“O faxineiro idoso empurrou lentamente a porta da privada com a palma da mão e viu os dois homens que tentaram me matar mortos dentro do box, mas arrumados como se estivessem vivos. Um sentado na privada com os dois braços pendentes e a cabeça virada para cima e para trás como se olhasse para o teto e o segundo ajoelhado com os braços em torno da privada e o rosto mergulhado no colo do que estava sentado. Desconcertado, o faxineiro idoso fechou novamente a porta do box e falou embaraçado.”
- Opa! Desculpe. Não queria incomodar. Eu volto outra hora.
(Continua)
0 comentários:
Postar um comentário