Por Igor Teo
Eu acho o budismo particularmente
interessante por ser uma filosofia-religião que, desde o princípio, se dedicou
a pensar sobre o problema da felicidade. Afinal, todos nós queremos ser
felizes. O que é necessário para alcançá-la?
Antes de ser o Buda, Sidarta
Gautama cresceu num palácio. Ele experimentou todo tipo de privilégios que um
homem rico e bem-afortunado de sua época poderia obter. Já quando adulto,
decidiu abandonar sua vida de luxo e viajar pelo mundo. Fora das muralhas de
onde cresceu, encontrou a dor, a velhice e a morte.
Sidarta descobriu que, por conta
disto, as pessoas estavam em constante sofrimento no mundo. E ele queria fazer
algo para ajudá-las. Portanto, decidiu que iria estudar a felicidade, e quando
a compreendesse, poderia finalmente curar o sofrimento do mundo.
Se um acadêmico de nosso tempo
desejasse estudar a felicidade, provavelmente realizaria um estudo estatístico
através de um questionário, ou talvez tentaria medir as reações fisiológicas de
suas cobaias diante de diversos estímulos.
Nada disso existia na época de
Buda. O método que ele desenvolveu era muito mais simples. Sidarta apenas
começou a meditar. A escutar a si mesmo.
Ele prestava atenção a sua mente,
a seus pensamentos, e até mesmo a sua respiração. Foi assim que ele começou a
entender como seu organismo reagia às diferentes coisas que lhe aconteciam.
Sidarta descobriu deste modo que
estamos muito enganados sobre como podemos encontrar a felicidade. Primeiro,
porque pensamos que a felicidade é algo a “encontrar”, como se fosse algo a
ganhar depois de ter um amor, uma casa nova, um trabalho ou uma realização.
É verdade que essas coisas podem
nos trazer alegrias, mas o prazer delas não é permanente. E isto não era o
suficiente para o jovem Sidarta. Como poderíamos nos contentar com a felicidade
de uma conquista se, no dia seguinte a ela, nos acostumamos ao ocorrido e
voltamos a nos sentir da mesma maneira que antes? Como nos contentar com algo
se isso não pode ser absoluto?
Pois nada é permanente. Nem o
mais rico palácio, nem o corpo mais belo. Muito menos a sensação de felicidade
ao possuir estas coisas. Um dia tudo acaba ou se transforma, de modo que a
alegria que você tem agora pode se tornar tristeza no momento seguinte.
É verdade que prazeres externos —
como riqueza, beleza e honra — são ilusórios. Mas Sidarta foi mais além que
todos os pensadores de sua época ao dizer que o modo como nos sentimos também é
uma ilusão. Durante um dia mesmo experenciamos uma variedade de emoções.
Nenhuma delas é permanente. Por que confiar então na sua felicidade?
Queremos a felicidade porque ela
nos faz sentir bem, diferente da tristeza, da raiva ou do medo. Se algo nos
deixa felizes, queremos manter esta sensação prazerosa. Como um beijo, um
abraço ou a sensação de ganhar uma partida de futebol.
Deste modo, o ser humano sempre
controlou o ambiente para atender aos seus desejos. Para que as coisas lhe
fizessem bem, e não mal. Criou a fogueira para enfrentar o frio. Mais
recentemente, criou o ar condicionado para enfrentar o calor.
Fazemos o que está ao nosso
alcance para evitar o sofrimento. Porém, Sidarta percebeu que o ser humano
frequentemente se excede nessa busca. Queremos controlar até o mesmo o
incontrolável.
Neste momento surge o sofrimento.
Quando fazemos de tudo para evitar a dor, a morte e a velhice, e mesmo assim
estas coisas ainda acontecem. Paradoxalmente, sofremos justamente quando mais
tentamos não sofrer.
Sidarta entendeu que estamos
sempre buscando algo. Ele mesmo também estava buscando a felicidade. E viu que
isto não estava lhe levando a lugar nenhum. Foi quando finalmente resolveu
desistir da busca. Assim se tornou o Buda.
Vivemos uma espiral infinita de
necessidades. Sentimos fome, sono, tesão, curiosidade, e por aí vai... Cada uma
destas necessidades nos traz um desconforto que queremos solucionar. O nome do
que acontece depois que solucionamos um desconforto, um sofrimento, é prazer.
Estamos sempre buscando o prazer.
Queremos coisas que saciem nossa fome, que curem nosso cansaço, que satisfaçam
o nosso tesão, que alimentem a nossa curiosidade. E por isto mesmo nunca
podemos ser felizes. Porque sempre estamos em busca de algo mais, nunca
contentes com aquilo que já temos.
Buda entendeu que precisava
erradicar o problema pela raiz. Se ele interrompesse o ciclo infinito de
necessidades, poderia se sentir mais satisfeito com as coisas que já tinha, por
mais parciais, imperfeitas e transitórias que elas fossem. Ele começaria a amar
o mundo mesmo com toda dor, velhice e morte.
Dito de outro modo: é claro que
um carro novo pode ser muito mais bonito que o seu atual. Mas um carro velho
funcionando já pode lhe ajudar a resolver os seus problemas. Será que você
realmente precisa de algo mais?
A resposta mais humana a esta
pergunta é sim. Nossa sociedade está orientada ao “progresso” constante e
infinito. Sentimos que precisamos fazer as coisas de um modo mais rápido,
potente e produtivo. Sempre falta algo que podia ser melhor. Precisamos sempre
de algo mais.
Porém, o preço de estar sempre
querendo mais é viver também sempre descontente. Ao compreender isto, Buda
ensinou que se dermos menos atenção a essas variadas necessidades daquilo que
pode nos faltar, perceberemos que já temos muitas coisas para sermos felizes
agora.
Eu sei que parece muito estranho
pensar que a solução para a infelicidade seja simplesmente “não querer mais o
que falta e ser feliz assim”. Temos um corpo, um organismo que precisa se
manter vivo. Sempre vamos precisar de algo: de comida, de proteção, de amor!
No entanto, essas coisas podem
ser mais fáceis e simples do que pensamos. A insaciabilidade do nosso desejo
nos faz querer sempre mais, como se tudo aquilo que temos nunca fosse o
suficiente. É por isto que o ensinamento budista é tão importante: precisamos
deixar de querer mais para perceber que já temos o suficiente.
Quando colocamos isso em prática,
percebemos que a natureza ao nosso redor é bela e merece ser apreciada com
atenção. Que nossos amigos são os companheiros que realmente precisamos. Que
nossa comida é saborosa para o nosso paladar. Todos os dias podemos
experimentar momentos de satisfação e gratidão, que normalmente desprezamos por
estarmos sempre buscando por mais.
Numa postura de maior aceitação,
Buda entendeu que podia curar o sofrimento das pessoas fazendo com que elas
esperassem menos pelas coisas que não podiam obter, e aceitassem com apreço
aquilo que já possuíam em suas vidas. Qualquer um poderia se tornar feliz
seguindo os seus passos.
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