Em um estudo publicado na Revista Nature Medicine, pesquisadores da School of Medicine - University of California, em San Diego, comprovaram que o excesso de limpeza pode prejudicar crianças.
Na verdade, quem não sabe da importância da vitamina "S" (de sujeira) na vida das crianças? Engatinhar (mesmo em chão desconhecido), colocar qualquer coisa na boca, ficar mordendo todo e qualquer objeto (como o limpíssimo telefone celular da mãe)... Será que isso faz bem, e a lavagem obsessiva das mãos nos tempos de gripe suína faz mal?
O estudo mostrou que a bactérias que vivem na pele ajudam no processo de cicatrização de ferimentos. Estafilococo - um tipo de bactéria presente naturalmente na pele - inibe a inflamação excessivamente agressiva da pele após um ferimento. Ou seja, a flora bacteriana é importante para nós.
A importância do estudo não é fazer uma apologia à imundice, mas desvendar novas técnicas para melhorar a cicatrização.
Mas serve para lembrar que o exagero, para qualquer lado, nunca é benéfico para as crianças.
De acordo com outra pesquisa, publicada pelo Journal of the American Medical Association, a resistência mostrada por crianças habituadas ao convívio com animais se explica pelo contato com as endotoxinas, substâncias liberadas por bactérias presentes na saliva do bicho - e também na terra , no chão: é a folclórica vitamina ‘S’, de sujeira mesmo.
As endotoxinas seriam capazes de provocar o organismo, estimulando uma ‘tolerância’ a agentes externos. "Às vezes, há mais bactérias no celular e na gôndola do supermercado do que na boca do cão. As crianças de apartamento não tomam chuva, não conhecem lama. Alguns pais têm pavor dessas coisas, o que é um erro", diz o diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), Renato Ávila Kfouri.
Na opinião da médica Ana Paula Castro, especialista da Unidade de Alergia e Imunologia do Hospital das Clínicas, o estilo de vida urbano das famílias modernas está diretamente relacionado ao aumento das alergias. "Não se trata só do excesso de limpeza. A urbanização está ligada ao sedentarismo, à obesidade precoce. E o tecido gorduroso produz substâncias inflamatórias que estimulam as alergias", diz ela.
Curiosamente, o aumento dos casos de alergias tem acompanhado a profusão de esterilizadores e anti-bactericidas no mercado. Segundo a Organização Mundial de Saúde, nos últimos 30 anos a porcentagem da população acometida por rinite alérgica passou de 15% para 25% e as ocorrências de dermatite cresceram de 5% para 12%. "Fatores ambientais são importantes, mas a genética também conta. Já ao nascer, o tipo de parto e a formação da flora intestinal ajudam a definir a propensão do bebê a ter alergias", ressalta Ana.
Apesar de concordar que o sistema imunológico precisa ser provocado para aprender a responder de forma favorável, Kfouri recomenda cautela ao relacionar alergias com padrões de limpeza. "O assunto é controverso. A exposição a certos antígenos estimula a tolerância imunológica e acredita-se que os efeitos a longo prazo sejam positivos, mas não se pode generalizar. Deve-se buscar o perfil imunológico de cada um para perceber, com bom senso, o que pode ser positivo para ela."
* O sistema imunológico é a defesa do corpo contra agressões externas. Ele começa a se formar na gestação, quando os anticorpos da mãe são transmitidos via placenta. Depois, o leite materno passa a ser a fonte principal de anticorpos, seguido pelas vacinas. O ritmo de trabalho das mães modernas, atrelado à diminuição do tempo de amamentação, pode influenciar o desenvolvimento do sistema imunológico do bebê.
* Sujar-se pode até fazer bem, mas limpar-se depois deve ser a regra. Normas básicas de higiene, como lavar as mãos após brincar com animais, escovar os dentes e banhar-se todos os dias devem ser respeitadas. A chupeta que cai no chão de casa não precisa ser esterilizada. Lavá-la com água é suficiente. Vale ressaltar que o abuso de produtos químicos na limpeza da casa pode ser tão nocivo quanto os antígenos domésticos, como o ácaro. [Veja mais sobre o assunto aqui]
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