«Ao contrário do que se pensa, a falta de autoridade, a cumplicidade com o erro, a tentativa de se "amar" os alunos, em nada os beneficia. Baixando as expectativas, a escola está a contribuir para que os resultados dos pobres sejam piores do que poderiam ser. Há quem diga que estes alunos carecem de afecto. Sucede que a escola não é o lugar indicado para lho dar. O que a esta compete, em primeiro lugar, é ensinar-lhes o que a aldeia, o bairro e a família jamais lhes poderão fornecer. As pieguices em redor dos coitadinhos nada resolvem.» (Mónica, M. F., (1997), Os filhos de Rousseau, Lisboa, Relógio D'Água, p. 11.)
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Vivemos
em tempos de uma "Pedogogia do Coitadinho" que não prepara os jovens
para os rigores da vida adulta, antes cria sociopatas incapazes de lidar com as
adversidades inexoráveis que advém do fato de se estar vivo. Como dizia Don
Juan Matus, mestre do Carlos Castaneda: "O Universo é Predador!" e devemos ser guerreiros impecáveis se quisermos sobreviver.
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Por Fabio Flores
Nada
é mais profano e perverso na relação ensino/aprendizagem que a “Pedagogia do
Coitadinho”, pois esta concepção anula toda e qualquer iniciativa de superação
e construção da autonomia por parte do estudante. Infelizmente ainda ouvimos
muitos educadores proferirem a sentença: “coitadinho, mas este aluno tem tantos
problemas, a gente deveria pegar leve com ele”.
Uma
rápida consulta a nossa história pode nos apontar inúmeros exemplos de pessoas
que tiveram uma vida pessoal hiper-atribulada, e, no entanto conseguiram obter
êxito pleno nas atividades que desenvolviam. Por esta razão, julgo como
criminosa a ação daquele que rotula de “coitadinho” um possível talento que é
assassinado pelo punhal da “caridade”.
Sigmund
Freud ficou conhecido como o pai da psicanálise, foi sem dúvida um dos maiores
intelectuais do século XX, porém conviveu com dramas pessoais bastante
intensos, a começar pelo fato de ser judeu e sentir na pele todo o ódio do
nazismo. Conviveu com as dores e os dramas de um câncer que não o impediram de
manter-se academicamente produtivo.
Albert
Einstein, o gênio da física e principal nome das ciências exatas no século
passado, comeu o pão que o diabo amassou durante sua infância em função da
gigantesca instabilidade financeira que vivia sua família. Não possuía
interesse por participar das atividades em grupo na escola, preferindo
isolar-se da turma. A habilidade lógica que possuía o instrumentalizava para
excelente desempenho em matemática, desempenho este que era inversamente
proporcional nas disciplinas que exigiam memorização, tais como história,
geografia e grego.
Paulo
Freire tornou-se o mais importante nome da educação na América Latina em função
da defesa e sistematização de uma educação libertadora pautada na vivência do
educando. Sua infância foi marcada pelas enormes dificuldades financeiras e
pela morte de seu pai-herói. O homem que foi reconhecido como doutor honoris
causa em diversas universidades do Brasil e do mundo foi alfabetizado num
contexto onde o chão era o quadro-negro e os gravetos eram o giz.
Ludwig
van Beethoven que encantou inúmeras gerações com seu talento latente na arte de
compor sinfonias que cruzam séculos com o frescor e sintonia, teve uma infância
marcada pelos desencontros afetivos de um pai alcoolatra, pelas sequelas de uma
varíola que deixaram marcas em seu corpo, da reconhecida surdez que poderia ter
assassinado seu talento. No entanto, o mesmo nos presenteou com nove sinfonias,
cinco concertos para piano, trinta e duas sonatas, e tantas outras obras
clássicas.
Como
tivemos a oportunidade de perceber neste breve relato da biografia de quatro
dentre as inúmeras histórias de superação que conheço, e que dão prova que os
problemas sociais podem dificultar, mas nunca impedir que o educando transcenda
os limites de sua realidade e alcance o sucesso a partir de seus próprios
méritos sem depender da “caridade”, nem tampouco formas escusas de promoção
pessoal.
Não
existe máquina, nem habilidade humana capaz de descrever qual é o limite do
outro. Quando resumimos o outro ao “coitadinho” estamos o condenando à inércia,
e o impedindo de acessar o maior de todos os conhecimentos, que é o
conhecimento de si mesmo. Estamos negando ao outro a dimensão afetiva do ato
educativo, pois nos colocamos numa posição de superioridade, na posição daquele
que tudo sabe, e por saber tudo, sabe até o quanto o outro não sabe, e tudo
aquilo que o outro nunca vai saber. Sobretudo ditamos o que o outro não precisa
saber, e assim tatuamos definitivamente na alma deste estudante a marca da
subserviência, e a eterna convicção de ser mais um “coitadinho”.
Fabio
Flores é palestrante e professor dos cursos de Comunicação Social e Pedagogia
da FAESA.
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