O
Pensamento que Liberta
Por Fabio
Almeida
“Não
existe pensador católico. Não existe pensador marxista. Existe pensador. Preso
a nada. Pensa, a todo risco” Millôr Fernandes
Nos
tempos pré-históricos, encontrava-se o homem num período de escuridão
intelectual, sua inteligência achava-se dormente. Tal como uma semente que
carrega dentro de si todo o potencial de um dia tornar-se uma grande árvore,
assim era o homem, um embrião em estado latente, prestes a se transformar.
À
medida que sua compreensão dos fenômenos físicos aumentava, o homem se
libertava dos seus medos e distrações, assim, gradativamente, encontrava mais
tempo para refletir sobre a sua existência e buscar o conhecimento. Movido pela
curiosidade, o homem passou a buscar um entendimento lógico e sistemático da
realidade natural, da origem do cosmos, bem como, o entendimento do próprio
pensamento.
Portanto,
se filosofia é amor pela saber, ela não nasceu na Grécia, mas sim, no dia em
que o homem despertou sua inteligência do sono da ignorância. É claro que não
podemos tirar o mérito dos gregos, por serem, provavelmente, os primeiros a
elaborar uma forma de pensamento que se desvincula das explicações míticas e
religiosas, formalizando o que hoje chamamos de filosofia. Mas não foram eles
os inventores do livre pensar.
Grandes
civilizações da antiguidade já faziam suas especulações filosóficas,
entretanto, o caráter religioso desses pensadores fez com que hoje fossem categorizados
como místicos e não como filósofos.
Antes
de tudo, um livre pensador, é um amante do saber. Não se importando se esse conhecimento é de
origem filosófica, científica ou religiosa, mas se esse conhecimento é
significativo para sua vida, para sua evolução como ser humano.
Da
mesma forma que o capitão de um navio, utiliza-se de uma bússola com quatro
pontos cardeais para orientar-se pelos mares, também o livre pensador, que é o
capitão do seu destino, precisa de quatro pontos cardeais para orientar sua
navegação pelos turbulentos mares do conhecimento. No entanto os quatro pontos
cardeais, a saber, são: o da ciência, da religião, da filosofia e da arte. Seu
destino: autoconhecimento e autorrealização.
Quando
possível, é através da Ciência que o livre pensador tira a prova real das suas
reflexões. Portanto, aqui, a ciência é vista sob uma óptica um pouco diferente
do cientificismo materialista. A Ciência representa o pensamento livre e
esclarecido, e a entendemos em seu significado original, do latim Scientia,
significando, conhecimento.
Conhecimento
este que deve ser útil e prático para o próprio indivíduo, pois, conhecimento
que não se usa, atrofia, tal como um músculo quando não se movimenta. Assim
também funcionam nossos neurônios, pesquisas recentes indicam que as áreas do
cérebro não exercitadas, são progressivamente desativadas.
Ao
livre pensador, religião é a vivência espiritual que ocorre no interior de cada
um. Através dela procuramos ligar nosso espírito individual com a essência do
Universo. Mas uma religião não institucionalizada, uma religião que não é
alienante, que não possui dogmas inquestionáveis ou leis imutáveis, mas que
pretende se realizar no interior do indivíduo, tal como o significado real da
palavra religião, religar-se com o divino, o grande Todo universal.
Filosofia
é simplesmente, “amor pela sabedoria”, união das palavras gregas philos e
sophia, e a compreendemos como uma atitude natural do homem que, movido pela
curiosidade, realiza a busca pelo conhecimento de si mesmo, das suas verdades,
a fim de compreender os mistérios da alma e do cosmos. Acordando com as antigas
inscrições do oráculo de Delfos “Ó homem, conhece-te a ti mesmo e conhecerás os
deuses e o universo”.
Entretanto,
o livre pensador, não deve obediências à filosofia acadêmica, que infelizmente
aprisionam seus alunos em labirintos metodológicos. Mas deve obediência a si
mesmo, a sua consciência. Não devendo reduzir sua capacidade de pensar aos
métodos, que em muitas ocasiões são tão úteis como formas de gelo: congelar o
pensamento em blocos iguais.
Como
nos atenta o filósofo brasileiro Luiz Felipe Pondé, os alunos de filosofia
devem: “pesquisar aquilo que não querem, de uma forma que não querem, a fim de
garantir verbas institucionais de pesquisa em grande escala. Esmagamos a
criatividade e as intenções dos alunos fazendo deles uma infantaria
estatística. A universidade mente: quer formar rebanhos dizendo que defende a
liberdade de pensamento”.
Arte,
do latim Ars, significa técnica ou habilidade de criar algo. Esse processo de
criação ocorre a partir da percepção que temos de algo, assim, expressamos
emoções e ideias através das habilidades que desenvolvemos. Ao final desse
processo, cada obra ganha um significado único.
Através
da arte, o livre pensador materializa suas reflexões, assim, ideias podem ser
expressas através da música, da escultura, do desenho ou da literatura. Para
tal, o artista deve expressar-se sinceramente, sem a intervenção de
metodologias ortodoxas, que por muitas vezes, desviam o pensamento autêntico,
convertendo o artista num mero refém de teorias.
Filósofo
ou Livre Pensador?
Antes
de Pitágoras, o filósofo era chamado de sábio, mas ele entendia que esse termo
qualificativo caberia apenas ao Eterno, ao Criador de todas as coisas, que tudo
sabe. Portanto, para Pitágoras, o homem em sua pequenez só pode ser um buscador
da sabedoria, um amigo da sabedoria, ou filósofo, união das palavras philos e
sophia.
Philos
é um termo grego que dá significado a uma das facetas do Amor. É o amor
fraterno, o amor entre a família, o amor entre amigos, pais e filhos. E está
diretamente relacionado com o nível mental do ser humano. Vale lembrar que os
gregos utilizavam três palavras distintas para os diferentes aspectos do amor:
eros, philos, e ágape.
Sophia,
também de origem grega, significa Sabedoria. Sophia, em algumas ramificações do
cristianismo e judaísmo, é também considerada como sendo o aspecto feminino de
Deus. Logo, todo livre pensador é também um filósofo, mas talvez, nem todo
filósofo seja um livre pensador.
O
filósofo que também é livre pensador é o amante da sabedoria que não tem seus
pensamentos restringidos por normas acadêmicas. Academia essa, que está longe
de ser aquela fundada por Platão, onde seus integrantes buscavam o livre pensar
em sua forma mais pura, sem as normas e os “métodos infalíveis” propostos pela
academia atual. Pois antes de tudo, um livre pensador não se preocupa em provar
nada para ninguém, ele simplesmente pensa. Uma vez transmitida a mensagem, a
lei é a mesma que ocorre nas redes sociais: gostou? curta! quer dividir com
mais alguém? compartilhe!
Contudo,
ele tem a liberdade para navegar pelos diversos afluentes do grande rio do
conhecimento, usar tudo, sem apegar-se a nada. Até que um dia, trilhando seu
próprio caminho, esteja preparado para ultrapassar o limiar do santuário,
entrando em contato com o mundo metafísico da suprema sabedoria, e quando aí
chegar estará próximo de completar sua grande obra.
Portanto,
a filosofia ou o livre pensar, não é algo para desocupados. A busca pela
sabedoria tem por finalidade iluminar cada um de nossos pensamentos, de nossas
palavras, de nossas ações. É dito na doutrina budista que: “Para se andar com
segurança, nos labirintos da vida humana, é necessário que se tenham como guias
a luz da sabedoria e a virtude”.
Mas
nem tudo são flores, a busca pelo saber, também tem os seus espinhos. Como bem
escreveu Salomão: “Porque na muita sabedoria há muito enfado; e o que aumenta
em conhecimento, aumenta em dor”. (EC.: 1:18). Entretanto, parafraseando o
escritor russo Isaac Asimov, “se a busca pelo saber traz problemas, não é a
ignorância que os resolve”.
Assim,
estamos longe de encontrar respostas imediatas, nosso caminho é mais demorado,
envolve questionamentos, pesquisas e constantes leituras. Isso porque, o livre
pensar não alivia os sintomas, mas trata a causa. Portanto, leva-se tempo para
começar a sentir seus efeitos, porque também, leva-se muito tempo para libertar
nosso organismo de toda uma miríade de concepções e ideias intoxicantes.
O
alimento dessa busca incessante é a curiosidade, é o querer ir além do óbvio e
a vontade de enxergar a realidade um pouco diferente daquela que é jogada aos
nossos olhos. No fim, queremos apenas encontrar nosso lugar no cosmos,
aceitando que somos apenas meros aprendizes da vida.
E
fiquem em Paz.
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